Companhia Catarinense de Rádio e Televisão (Raquel)

Companhia Catarinense de Rádio e Televisão um testemunho

Raquel S.Thiago *

Na década de 1970 o Brasil vivia um clima de encantamento , era a década da TV, quando uma serie de inovações; as transmissões em rede via satélite possibilitaram o consumo televisivo imediato e “o mundo tornou-se infinitamente menos secreto” , frase lapidar cujo autor não lembro, mas peço emprestada.
Também em 1970 a Copa do Mundo levaria a 4 milhoões de residências aparelhos que proporcionaram a outros tantos milhões de brasileiros a inusitada experiência de assistir os jogos na poltrona de casa ou da sala do vizinho . Lembro com clareza dos festejos na Praça Nereu Ramos, todo mundo entoando o hino do tri… Foi um tempo de glória para o povo que até esqueceu que vivíamos um dos períodos mais intensos da ditadura militar. O General Emílio Garrastazu Médici era Presidente da Republica e entusiasta do futebol. .
Outras regiões brasileiras fora do eixo Rio-São Paulo despertaram para a importância da televisão não apenas para as comunicações e seus desdobramentos, mas como nova fonte de lucro. Nesse contexto, em reunião da ACIJ ocorrida no ano de 1972, o empresário Dieter Schmidt em entusiasmado discurso acerca da importância da televisão como poderoso meio de comunicação, levou aos associados a idéia de que Joinville , sendo a maior e mais rica cidade do Estado, poderia ter também seu canal . Tal idéia foi imediatamente acolhida pelos presentes e o Sr. João G. Spring ficou encarregado de realizar um estudo acerca do assunto . Spring afundou-se na leitura de matéria existente na época, artigos, revistas, livros.
Passados alguns anos Spring me confessaria em entrevista: “ olha, Raquel , para te dizer com toda franqueza , eu fiquei apavorado com o poder deste instrumento de comunicação, nunca tinha atentado para a força, a força do poder de uma áudio-visual. E mais: um áudio-visual com movimento, não é? Um áudio-visual com movimento na tua casa! Fiquei impressionado, no curso do estudo, fui tomando conhecimento de outros aspectos das comunicações, porque estava explodindo no mundo. ( A entrevista, gravada, está sob a guarda do acervo do Laboratório de História Oral do Arquivo Histórico de Joinville ).
Convicto das vantagens que um canal de televisão traria para Joinville, Spring apresentou relatório. Após analisado e aprovado, resolveram os empresários fundar a Companhia Catarinense de Rádio e Televisão e correr atrás da concessão do Governo Federal. O novo empreendimento tinha que ficar tanto quanto possível em poder da comunidade, independente, livre das amarras monopolistas, uma estação regional. A primeira preocupação, portanto, foi obter a concessão.
Assim, em 3 de dezembro de 1973, no salão nobre da sede da Associação Comercial e Industrial de Joinville, reuniram-se os subscritores do capital da Companhia Catarinense de Rádio e Televisão sob a presidência do Sr. Etienne Arnaldo Douat, para deliberarem sobre a constituição da empresa, bem como aprovação dos seus Estatutos, aprovados por unanimidade ( ata da Assembléia Geral de Constituição da Companhia Catarinense de Rádio e Televisão de 3 de dezembro de 1973). Também por unanimidade de votos foram eleitos os senhores José Antônio Navarro Lins, Presidente ; Oswaldo Christiano de S.Thiago, Diretor Superintendente e o Sr João Guilherme Spring, Diretor Financeiro. Para membros efetivos do Conselho Fiscal, foram eleitos os srs. Etienne Arnaldo Douat, Ludovico Baltasar Buschle e o Sr. Curt Alvino Monich. Para suplentes do Conselho Fiscal foram eleitos os srs. Arthut Oscar Langsch ; Norberto Willy Schossland e o Sr. Alphons Ronald Albrecht Schmalz .
A lista de nomes acima citados é importante na medida em que legitima um grupo de joinvilenses como pioneiros da televisão em nossa cidade, cerca de vinte anos após o surgimento da TV no Brasil .
A partir daí iniciava-se uma saga que duraria seis anos, um tempo de árduo e desgastante trabalho de divulgação, captação de recursos , conquista de canal, concessão nada fácil na época.
O pequeno grupo empreendedor sonhava, e sonhava com a TV Comunitária , uma utopia . Lutou durante 6 anos atrás de concessão, vendendo ações, tentando mostrar para possíveis investidores o impacto que um Canal de televisão independente e livre das amarras monopolistas causaria para a cidade. Eu mesma, que na época trabalhava na Alpha –Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários, vendi ações da Companhia Catarinense de Rádio e Televisão. Sou testemunha de todo o processo. Tudo isso não foi suficiente para garantir a Joinville uma televisão comunitária e independente .
Infelizmente os industriais joinvilenses viviam um momento de euforia com os ótimos resultados do chamado “milagre brasileiro” . Trataram de expandir suas empresas e poucos se interessaram pelo projeto da indústria televisiva. Deste modo, em 1979, a falta de capital e “know-how” forçou um acordo com a RBS – Companhia Catarinense de Rádio e Televisão que se juntou ao grupo joinvilense como sócia minoritária .. No final daquele ano, com pompa e circunstância a Companhia Catarinense de Rádio e Televisão foi inaugurada com animada festa nos salões da Sociedade Harmonia Lyra.
Em 1980, a RBS assumiu o controle acionário e administrativo da Companhia, frustrando aquele grupo de sonhadores que ousaram lançar-se numa empreitada desafiadora diante das forças do monopólio. Espero que este testemunho chegue a boa parte dos cidadãos joinvilenses. Minha formação de historiadora leva-me a considerar, neste caso, que história e memória são elementos imprescindíveis para a trajetória de crescimento e desenvolvimento da sociedade de modo a evitar-se os mesmos erros do passado, ..

Raquel S. Thiago
• Professora Emérita da Universidade de Joinville ( aposentada)
• Membro efetivo da Academia Joinvilense de Letras
• Membro honorário da Academia de Letras de São Francisco do Sul

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