Esses duendes tão míopes

(Os primeiros 4 capítulos do livro publicado pelo acadêmico no ano 2000)

 

Figuras da mitologia greco-romana emprestaram seus nomes aos personagens de Mióptica – o país da miopia.

 

A inocência acaba

quando se deixa de ser criança.

A miopia começa

quando não mais se quer ver.

 

O dia prometia ser tão belo quanto o anterior. E Pedro não queria perder um só minuto, um só pedacinho das férias, no sítio dos avós. Por isso ele corria. Pernas finas ao vento, saltitando como lebre morro acima, sumindo entre touceiras altas até o topo da colina. Agora, era só esperar. Sentado na pedra de sempre, debaixo da velha mangueira, arrancou o caule longo de uma gramínea e pôs-se a mastigar a ponta ácida e açucarada até ver a bola de fogo aparecer por detrás da cordilheira. E gritou:

– Bom dia, Sol!

Podia jurar que o despontar daquele dia era ainda mais esplendoroso que o anterior. O paredão rosado à sua frente ia mudando para o alaranjado, depois amarelando, amarelando, até o azul tomar conta das bordas do firmamento. Uma vez mais, Pedro se deliciava com o que via.

Aquele seria um dia especial. Iria até a cachoeira branca onde curimbatás costumavam subir para a desova. Abriu a pequena sacola e desembrulhou o lanche que devia comer lá pelas nove horas. Só queria dar uma olhadinha. Já se antevia saboreando a fatia de pão de milho com goiabada e farto queijo caseiro que a avó havia preparado, enquanto se divertia com o espetáculo da piracema. O Sol começava a esquentar e Pedro disparou colina abaixo, levantando duas codornizes que voaram na direção do riacho, num arfar barulhento de asas. Seguiu o mesmo caminho e logo estava correndo junto à margem, vendo-se refletido nas águas cristalinas.

Quando parou de correr, já estava em boa distância da casa, embrenhando-se na mata. Logo estaria na trilha que vai dar na cachoeira. Mas antes ia passar pela tosca cabana do lenhador. Pedro gostava dele e das histórias sobre duendes da mata que o lenhador afirmava aparecerem de vez em quando para lhe roubar mel e farinha. Preto como breu, Anacleto tinha acordo com o bom Deus: Para cada dia de saúde, um dia de trabalho pesado!

– Dar duro não mata ninguém – dizia ele. – Deita na rede e vai estar na posição que as minhocas gostam.

Anacleto cortava lenha para o avô de Pedro, mas não dependia disso para o sustento. A terra fértil lhe dava bons legumes. Tinha fruta e mel nos fundos do quintal. E, no riacho de águas claras, curimbatás em abundância para pescar.

– Então o menino vai até o véu da noiva? Uma boa caminhada…

– Meu avô diz que é tempo da piracema. Quero ver os curimbatás subirem a correnteza para a desova.

– Coisa linda de morrer, menino. É quando eles estão lá. Pegando os que se debatem nas pedras.

– Eles quem, seu Anacleto?

O lenhador balançou a cabeça e mostrou todos os dentes num sorriso maroto.

– Os duendes. São loucos por peixe, mas lhe digo uma coisa: Não sabem pescar. Esse é o problema dos preguiçosos. Se não lhes ensinam, eles pouco fazem por aprender.

– Anacleto e suas histórias…

– Volte antes de o Sol dormir – disse o lenhador, colocando algumas amoras na sacola do garoto. – É quando eles aparecem.

Pedro achou graça e despediu-se do lenhador, que ficou olhando até vê-lo desaparecer entre as árvores que balouçavam estranhamente.

– Santo Deus, vai cair um temporal! Volta, Pedro!

Talvez o vento, o riacho a correr, ou o ruído dos próprios passos. A verdade é que Pedro não ouviu os brados do lenhador.

Já andava algum tempo quando escutou o grasnar familiar das gralhas-azuis nas copas altas das araucárias. Pássaros simpáticos de rica plumagem, que davam o exemplo do ganhar e doar. Enterravam o fruto da pinha, armazenando alimento para o futuro. E a cada pinhão desenterrado, elas deixavam outro que germinava um novo pinheiro.

Subitamente, as gralhas ficaram assustadas e sumiram. A mata nunca lhe pareceu tão escura. Pedro apressou o passo. Logo ele estava em campo aberto, percorrendo a campina em direção da cachoeira, o vento a lhe desalinhar os cabelos cor de trigo. Manto escuro e ameaçador trouxe o primeiro trovão. Todo o firmamento roncava, e o manto escuro foi riscado por uma luz branca de alto a baixo. Pedro ia contando, enquanto corria. Um, dois, três, quatro, cinco… E escutou o ribombo ecoar pela campina.

– Está mais perto do que pensei.

Ele já podia ver a cascata ao longe e escutar o barulho da água despencar do alto da penha, levantando a nuvem branca ao quebrantar contra a grande bacia de pedras, onde os curimbatás costumavam desovar. Foi quando a chuva leve se transformou no maior aguaceiro. Debaixo das árvores próximas à cascata lhe pareceu o lugar mais seguro. Encharcado até os ossos, procurou se abrigar na sapucaia mais frondosa.

O clarão intenso e o barulho ensurdecedor vieram ao mesmo tempo. O raio arrancou parte da árvore e o galho quebrado atingiu Pedro na cabeça.

 

1 – A Fraqueza

 

– Hei, garoto, acorda!

A cabeça de Pedro parecia girar e ele abriu os olhos com dificuldade.

– O que você está fazendo aí, deitado no chão?

De onde vinha aquela voz estranha e estridente? Pedro levantou-se e olhou em volta. Lá estava ele, vestido de verde, um largo cinto de couro a lhe envolver a barriga e um gorro vermelho sobre a cabeça calva.

– Devo estar vendo coisas… Um anão!

– Avoamuoãna!

– Não entendi nada – disse Pedro. – Está, por acaso, me xingando?

– Estou, e não por acaso. Você é um garoto estúpido, que não sabe distinguir um duende de um anão. Olhe minhas orelhas!

Tinha uma cara engraçada, bochechas redondas, olhos pequeninos por detrás dos grandes óculos e orelhas pontudas.

– Então eles existem? – indagou Pedro, esfregando os olhos para certificar-se de que não estava vendo coisas.

– As amoras estavam deliciosas.

– Quem te deu permissão de vasculhar minha sacola? – disse Pedro, aproximando-se do pequeno duende, que baixou os olhos e fungou encabulado.

– Não pude resistir. Para onde eu vou, não posso encontrar amoras como as do lenhador.

– E para onde você vai?

– Para qualquer lugar, desde que longe de Mióptica.

– Mióptica? Que lugar é esse?

– O país da miopia – respondeu o duende, fazendo uma mesura. – Permita que eu me apresente. Sou Pistor, o padeiro. E você é Pedro, neto do grande fazendeiro.

– Como sabe? – Eu nunca havia visto ou falado com um duende!

– Somos uma raça privilegiada, Pedro. Inteligentes e criativos… mas de visão muito curta.

E assim dizendo, Pistor deu duas piruetas e desapareceu.

Pedro estava tão perplexo que se esqueceu por completo da piracema. Só então notou que a tempestade havia desaparecido tão rápida quanto o duende. Ainda não acreditando no que vira, caminhou até o sopé da cachoeira onde a água cristalina brincava entre as pedras e os curimbatás emergiam em cardumes cintilantes. Eufórico, Pedro viu-se rindo e aplaudindo. E escutando o eco do seu aplauso. Eco?

Lá estava o duende sobre uma pedra, contorcendo-se de tanto rir e de aplaudir.

– Pistor, por que foi embora?

– Comprometimento – respondeu o duende, com nova mesura. – Para muitas perguntas, muitas respostas. Você acaba se tornando responsável.

– E daí?

– Está vendo, está vendo – resmungou o duende, tentando uma nova pirueta. – Satnugreperpmes!

– Oh, não! Desta vez você não me escapa – gritou Pedro, saltando sobre o duende, antes que ele desse a segunda pirueta. – Eu não te chamei e por duas vezes você interferiu em minha privacidade. Agora, queira o não, você é responsável. Que língua é essa que eu não entendo?

– Solte-me, se quer respostas. Satnugreperpmes pra lá… e Sempreperguntas pra cá…

– Falas ao contrário. Por quê?

– Perguntas irritam os duendes. E agora, sem demora, façamos um trato. Três respostas, se perguntas não forem feitas.

– Negócio fechado! Para iniciar, fale-me de Pistor.

– Você é muito esperto – respondeu o duende, ajeitando o gorro e levando a mão ao peito cheio de trejeitos. – Sou padeiro de Mióptica. Em toda minha vida tenho produzido o alimento que mata a fome. Ainda todos a dormir e Pistor já está com a mão na massa, faça frio ou faça chuva. Centeio e cevada para os que podem pagar. Para os que não podem, pães de trigo ou de fubá. Já perdi a conta e cansei de trabalhar. Qual a tua segunda pergunta?

– Pergunta nenhuma eu fiz e duas respostas você me deve. Deixar de fazer o que em toda a tua vida vinhas fazendo não tem sentido. Conte-me direitinho essa história.

– Trate um profissional como tal. Na Idade Média, aprendizes levavam de três a cinco anos para aprenderem a nobre arte da panificação e eram recompensados pelo que produziam. Mas não em Mióptica… Lá não se ganha na justa porção. Oh, sina a minha: Faço o pão e me alimento de farinha.

Pedro condoeu-se ao ver lágrimas ampliadas pelas grossas lentes dos óculos do duende.

– Motivos você deve ter para tamanho pranto, ou não estaria deixando a sua Mióptica.

– Lamento igual tem o que lá o trigo planta. Dele exigem tenros grãos, mas pouco lhe sobra para a janta.

– Não compreendo, Pistor. Meu avô colhe nova e farta safra e todos na fazenda festejam o quanto a terra lhes vai dar.

– Teu avô deve ter bons óculos – lamuriou o duende. – Qual tua derradeira questão?

– Mióptica!

– Quer conhecer o país da miopia? – indagou o duende, enxugando os olhos e limpando os óculos. – Faço-te um favor. Ao invés de te contar, dou-te o salvo-conduto para que possas vê-la com teus próprios olhos.

– Verdade? – exclamou Pedro, sem conter o entusiasmo.

– Cuidado com as promessas de um duende mioptense. Eles são inteligentes e criativos, mas a pouca visão não lhes dá credibilidade.

– Não me desaponte, Pistor – bradou Pedro. – Fale-me de Mióptica… Ou leve-me até ela.

– Lá! – bradou o duende, apontando para a cachoeira. – Por detrás daquele véu da noiva você encontrará a passagem.

Incrédulo, Pedro olhava para a cascata enquanto o duende desaparecia. Sobre a pedra, ficou um cartão vermelho com letras douradas. Era o salvo-conduto para o país da miopia.

Pistor não parecia ser um mau duende. Deixava-se apenas abater pela fraqueza, transferindo a culpa do seu insucesso.

 

Pistor – Padeiro. Homenagem dos romanos a Júpiter, por tê-los ajudado ao sugerir que jogassem pães sobre os escudos dos invasores, que desistiram de vencer, pela fome, um inimigo tão abastecido.

 

 

2 – A prepotência

 

Saltando de pedra em pedra e equilibrando-se, Pedro aventurou-se por detrás da cascata. Um salto a mais e o volume d’água atingiu-o em cheio, sugando-o para dentro de uma caverna. Ali estava! Havia mesmo um estreito caminho entre a encosta úmida e a estrondosa cortina d’água, levando-o até duas pequenas e toscas portas de madeira no final do túnel.

Cautelosamente, Pedro bateu na porta da direita sem obter resposta. Tentou a da esquerda e ficou aguardando. Como não obteve resposta, voltou a bater. Desta vez, com mais força.

– Para com isso! Não vês que estou ocupado? Entra na fila e aguarda tua vez!

A voz vinha lá de dentro. Uma voz prepotente e de poucos amigos. E Pedro arriscou:

– Como posso entrar na fila se estou sozinho?

Não houve resposta. Pedro aguardou mais um pouco e voltou a bater.

– Para com isso! Não vês que estou ocupado! Entra na fila e aguarda tua vez!

– Como posso saber que está ocupado, com a porta fechada?

– Apresenta teu salvo-conduto! – ordenou a voz, ainda mais irascível.

– Onde, ou como devo apresentá-lo? – perguntou Pedro, tirando do bolso o cartão vermelho com letras douradas.

– Tem certos dias em que é melhor ficar na cama – resmungou a voz, com rabugice, – Por debaixo da porta, seu paspalhão!

Pedro olhou para uma das portas e depois para a outra. A figura enigmática de Pistor passou como um relâmpago em sua cabeça.

– Da direita ou da esquerda? – arriscou ao perguntar.

– Por Olimpo! Essa brincadeira pode lhe custar 100 mil dracmas. Passe logo o salvo-conduto, ou volte amanhã. Está na hora de fechar.

Pedro apressou-se a passar o cartão por debaixo de uma das portas e a luz vermelha acendeu quando ela se abriu. Por detrás de um balcão, protegido por meia parede de vidro onde se lia “Sr. Portuno – aduaneiro de Mióptica”, um duende mal-encarado, rosto comprido e nariz adunco, levou Pedro a pressentir que não foi bom negócio aceitar aquele salvo-conduto.

– O que tem a declarar? – perguntou o duende, sem olhar para ele.

Pedro notou que o duende era míope e não usava óculos.

– Temo que… Nada, Sr. Portuno.

– Por acaso, você é daltônico? Não foi a luz verde que se acendeu, foi? 100 mil dracmas por tentativa de suborno!

– Cem mil dracmas?

– Você está fora há três dias, Pistor. O povo de Mióptica clama por pão, enquanto você perambula por aí.

– Está enganado, senhor. Meu nome não é Pistor. Sou Pedro e nada entendo de pães.

– A quem pensa enganar? – esbravejou o prepotente aduaneiro. – São 100 mil dracmas por tentativa de falsa identidade. Guardas!

– Por favor, senhor Portuno – voltou a suplicar Pedro, nervosamente. – Veja! Nem sou duende…

– Mais 100 mil dracmas por perjúrio. Guardas!

E, assim, Pedro foi conduzido para a cadeia de Mióptica, sem entender o que fizera por merecê-la.

Portuno, o segundo e estranho mioptense que ele havia conhecido, abusava da arrogância e se esquecia das obrigações que seu cargo exigia. Esse duende era dominado pela prepotência.

 

Portuno – Divindade romana que guardava portas e passagens, velando também sobre os portos.

 

3 – A apatia

 

Na manhã do terceiro dia, a porta da cela foi aberta e Pedro viu entrar a figura mais enigmática que um duende pudesse ter. Trazia nas mãos um enorme livro com capa de couro e a palavra LEX em relevo. Fortes rugas na testa surgiam cada vez que ele se esforçava por abrir os olhos, o que era difícil pelo peso das enormes pálpebras. Com cauteloso cumprimento, Pedro respondeu ao sorriso triste quase tímido do duende.

– Aqui estou para ajudá-lo, meu caro Pistor.

– Fico–lhe grato, mas não sou Pistor – respondeu Pedro.

– Por Olimpo, devo ter entrado na cela errada! Viu, por ventura, algum padeiro por aí? Cumpre–me defendê-lo.

– Sou quem procura, mas não sou padeiro.

– Se não é Pistor e padeiro também não, quem você é então?

– Sou Pedro e preciso de ajuda. O fraco Pistor deu-me um salvo-conduto e com ele toda essa confusão.

O duende, perturbado, andava de um lado para o outro. Abriu o pesado livro e folheou algumas páginas. Coçou a cabeça e as fortes rugas voltaram a aparecer na testa.

– É incrível! Absolutamente inacreditável! – exclamou, fechando o livro com indolência. – E, ao mesmo tempo, inteiramente inadmissível!

– Posso saber do que está falando? – indagou Pedro, sem entender.

– Esqueci de trazer o segundo volume. Este não vai além da letra M. Nem Pedro, nem salvo-conduto, nem Pistor, nem Padeiro… Tudo está no segundo volume. Dura é a vida jurídica.

– Você não parece ser um advogado. Qual é o seu nome?

– Se a memória não me falha… Seleno! Aqui tem o meu cartão. Foi um lauto prazer atendê-lo. Meus honorários ser-lhe-ão logo remetidos.

E assim dizendo o duende lhe deu as costas e foi saindo como entrou.

– Dr. Seleno! – clamou Pedro, ainda perplexo, – o senhor esqueceu o livro.

– Que bobagem a minha. Devo estar muito atarefado…

O duende deixou a cela com o livro debaixo do braço, ficando a porta aberta. Como pode ser tão esquecido, disse Pedro consigo mesmo. Ou será apenas desatenção?

Não! O termo pelo que faz é apatia, pois dos honorários bem se lembrou. Pobre Seleno, indolente por não escolher a profissão certa. Nem as dracmas haverão de lhe proporcionar felicidade.

 

 Seleno – Pastor da Arcádia, abandonado por Argira quando

envelheceu. Sofreu tanto que Vênus concedeu-lhe a graça do esquecimento.

 

4 – A prudência

 

A cela aberta logo estaria vazia. Pedro não encontrou dificuldade de passar pelo guarda dorminhoco que ressonava em sono profundo, chave presa ao pescoço e mãos entrelaçadas sobre a barriga. Embora desejoso de conhecer Mióptica e seus estranhos habitantes, temia pelo próximo encontro. Receio infundado, pois duendes cruzavam seu caminho e tiravam o gorro em amistosa saudação.

Pedro se encantou com as belas casas de tijolos vermelhos e de grossos caibros de madeira entalhados, como eram as portas e janelas. As ruas estreitas e revestidas e pedras roliças estavam arborizadas e floridas. Duendes pequeninos brincavam alegremente em volta de um chafariz de águas claras, no centro da praça.

A algazarra levou Pedro até os pequeninos que, curiosos, pararam de correr e o cercaram, com olhares e perguntas: Quem é você? Quem são seus pais? Que brincadeiras você conhece? Por que teus olhos são ainda tão grandes?

Só então Pedro notou que todos eles ainda tinham olhos grandes e atentos.          – O que leva os duendes adultos a perderem a visão? – indagou.

Os pequeninos deram de ombros. Tomaram Pedro pelas mãos e voltaram a correr em volta do chafariz, despreocupados e felizes.

– Um dia também vocês serão adultos – insistiu Pedro, falando mais alto para que escutassem.

– Você fala como um deles – respondeu a pequenina e bela duende que lhe tinha pela mão. – Logo vai querer provar o quanto é sábio. Seja prudente e não te aproximes de Acadina, sem estar preparado.

Pedro puxou-a para o lado e ambos saíram da roda.

– Qual é o teu nome?

– Métis – ela respondeu, gratificando-o com um sorriso.

Suas faces rosadas tornaram-se rubras e longas pestanas tremularam, ressaltando os belos olhos azuis.

– O que você quer dizer com “não te aproximes de Acadina”?

– É a Fonte da Sinceridade. Você está mais perto dela do que possa imaginar, filhote do homem… Se não fechar os olhos.

– Temo não te entender…

– As águas de Acadina têm o poder de revelar a sinceridade dos juramentos nelas jogados. Imprudente é o adulto que, não distinguindo o certo do errado, engana a si próprio confiando falsos juramentos às suas águas.

– E onde fica essa fonte, Métis? Onde?

– Vê! Nem adulto é e já tem pressa. Logo teus olhos estarão pequenos e não vai enxergar o que convém, mas o que for de seu interesse.

– Não, Métis. Juro que não.

– Você quer, no entanto, saber onde a fonte se encontra.

Pedro sentiu o coração disparar. A pequenina e sábia Métis havia colocado o juramento dele na balança da sinceridade.

– Quero ser prudente como você, Métis. Como me tornar adulto sem perder a visão?

– Primeiro, deve procurar o sábio Honos. Quando o encontrar, estará preparado para a Fonte de Acadina.

A duendezinha, então, saiu correndo para o grupo dos pequeninos, que continuavam a brincar junto ao chafariz. Pedro ainda a seguiu com o olhar e depois não a viu mais.

Com a jovem Métis, ele havia aprendido a não fechar os olhos e agir com precaução, lembrando que a prudência é necessária quando a emoção é mais forte do que a razão.

 

Métis – Sua sabedoria e prudência chegaram a perturbar Júpiter, seu marido. Ele a engoliu, transformando-se no mais sábio dos deuses.

 

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