Meu céu particular

A ideia de um lugar no Universo (ou fora dele), onde os bons receberiam depois da morte sua recompensa pelos atos praticados, existe desde tempos imemoriais (que belo lugar-comum). Para os gregos era o Olimpo, para os nórdicos o Walhala, para os índios americanos os sagrados campos de caça. Diferentes crenças e religiões interpretam ou até imaginam esse local – o céu – de diferentes modos.

Se o céu vem se enchendo de “boas almas”, sem rodízio delas, desde o tempo da Criação, deve ser um local deveras extenso para caber tanta alma. Qual será então o tamanho do céu?  Sua imagem padrão é a de um conjunto de nuvens sobre as quais flutuam os bem-aventurados, executando harmoniosas melodias numa harpa. E eu, que não sei tocar harpa, o que farei nessas incontáveis horas livres na eternidade? Será que dá pra escrever?

Se permitirem dar minha opinião, acho que o céu deveria ser um domínio pessoal, diferente para cada pessoa, conforme seus gostos e sua personalidade. Um céu particular. Quem gosta de navegar, faria jus a um extenso oceano, limpo de ondas e tempestades, com um vento fresco e acolhedor. Quem sabe com o Bing Crosby na popa cantando “True love”.

Quem adora futebol, já se instalaria em um campo com impecável gramado, onde assistiria a um suceder infindável de jogos e campeonatos. Os “dons-juans”, se é que essa categoria merece o céu, cairiam num harém com lindas odaliscas, gueixas e índias de Hollywood.

Meu céu particular seria ambientado na Paris do começo do século 20, numa eterna primavera, com suas luzes, jardins, bulevares e velhas edificações. Moços de chapéu palheta fariam serenatas debaixo de românticos postes com lampiões. Cinemas semelhantes a palácios, com monumental sala de entrada, exibiriam os filmes que eu gostaria de ver e que nunca foram produzidos.

Moças com luvas e grandes chapéus passariam, à tarde, em carruagens pelos bulevares floridos. Almas de grandes escritores perambulariam pelos bares, restaurantes e livrarias. Jornais publicariam os derradeiros capítulos de folhetins de Balzac, Dumas ou Eugene Sue. Músicas típicas parisienses, cantadas por Edith Piaf e Maurice Chevalier (não há problema na mistura de épocas, pois o tempo no céu não tem existência).

Haveria bosques (adoro a palavra bosque) com antiquíssimos carvalhos e caminhos pejados de folhas secas. Moinhos com pás de madeira à beira de regatos, com gansos correndo pela vegetação amarelada, como num quadro impressionista.

Mais não descrevo para não despertar inveja; mas vá preparando sua opção, quem sabe o Criador resolva acatar minha sugestão.

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