Pobre crônica!

Vida breve tem a crônica. O cronista procura, em sua visão, peneirar a realidade; senta diante da máquina (ou da telinha do micro) e escolhe as palavras para se comunicar com o leitor, preocupa-se com a coerência do texto e com a clareza das frases. No dia seguinte seu texto já está fazendo parte de uma pilha de papéis recicláveis ou servindo de forração para gaiola. O cronista persegue o sonho quase impossível da imortalidade de seus textos.

Localizada, às vezes, num canto do jornal, alguns leitores passam por cima, ávidos de recolher as desgraças do dia, os escândalos políticos, as surpresas do futebol. A crônica está do lado do time do entretenimento. Se o leitor quer saber de notícias, fatos, denúncias, controvérsias, que leia mesmo as outras partes do jornal.

Sob esse aspecto – o de entretenimento – a crônica nasceu no espaço denominado folhetim, no século 19, junto com fofocas de sociedade e capítulos de romances publicados na parte inferior das páginas dos jornais, os romances-folhetins, considerados pais das novelas atuais. Na época, todos os grandes escritores passaram pelas páginas de jornal, seja como cronistas (Machado de Assis, José de Alencar), seja como romancistas (Balzac, Alexandre Dumas).

Em matéria de popularidade, a melhor crônica de um Veríssimo não vale a bela letra de um “ai, se eu te pego!”, que teve seus dias de glória. Em shows ou em programas de calouros ninguém se apresenta para declamar uma crônica de Rubem Braga ou mesmo de Sérgio Porto. Sua imortalidade não passa de alguns minutos.

A crônica se apresenta como um retalho da realidade. Um misto de jornalismo e literatura. Às vezes é alegre, saltitante como um passarinho; às vezes, filosófica, poética, nostálgica; outras vezes, triste como um samba-canção sem a música. É um espaço de lazer, de descontração, na torre de Babel que são os acontecimentos do universo.

Adaptou-se tanto em nosso país, que parece ser um gênero essencialmente brasileiro, indispensável na imprensa como contraponto à crueza dos fatos cotidianos. Você já ouviu falar de cronista sueco, russo, francês ou espanhol? Cronista tupiniquim existe bastante. Rubem Braga sobreviveu literariamente apenas publicando crônicas.

Desnecessário para alguns, sedutor para outros, o cronista segue sua sina de Sísifo, o personagem mitológico: empurrar uma enorme pedra até o cume de um monte, para que essa volte rolando para baixo. E aí começa tudo de novo.

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