Respeito aos mais velhos

Meus pais até que foram liberais para a época: permitiram que nós os tratássemos por “você”, quando todos os meus amigos diziam “senhor” para os pais e os mais velhos. Mas essa foi a única concessão, o resto era igual. Eram duros no respeito que devíamos às pessoas e às regras. Não me lembro de ter levado surras, mas fiquei muitas vezes de castigo (uma vez foi um mês inteiro sem sair de casa) e o beliscão de mamãe era terrível.

Tínhamos pois respeito e até obediência aos mais velhos: avós, professores, padre, médico e pais de amigos. Era uma coisa natural. Não nos sentíamos humilhados ou tolhidos em nossa liberdade. Éramos livres e respeitávamos. Os mais velhos exerciam sua autoridade e transmitiam claramente o seu afeto. Eu me sentia orientado e acolhido.

Hoje vemos o choque de gerações desencadeando muitas vezes incompreensão e mesmo violência. Os pais são desobedecidos, os avós ignorados, os professores hostilizados. O que ocorreu? A liberdade para os jovens tornou-se insuficiente? Eles perderam a noção de gratidão e respeito? Os pais perderam a autoridade? Os professores deixaram desaparecer o encanto de uma boa aula?

Talvez a história não seja assim tão ruim. Pode ser que a maioria dos jovens continue respeitosa e com noção de gratidão. Mas como entender o outro grupo, o daqueles que efetivamente tomaram outro rumo?

Uma parte desses comportamentos agressivos pode ser explicada por questões pontuais, como o uso de drogas ou ligação com uma turma violenta e rebelde. Esse pessoal é difícil mesmo e a sociedade deve aprimorar seus mecanismos de educação, reabilitação, limitação e punição, cada um com seu peso.

Mesmo a outra parte dos jovens, a mais cordata, passou a reverenciar menos os idosos. É uma transformação para o mal? Talvez não. Talvez possamos tentar entender o porquê da mudança. Afinal, antes os jovens eram ávidos por receber os ensinamentos dos avós, cheios de sabedoria consolidada. Na cultura oriental então, o idoso era quase santificado. Hoje as pessoas mais velhas perderam esse status. Em época em que o Google reina, o conselho do vovô conta muito pouco.

Além disso, os velhos estão vivendo bem mais, ficam aposentados por muito tempo, são vítimas de doenças mais complicadas, tornam-se eventualmente um fardo para a família. Isso é o inverso de antigamente, quando os homens viviam pouco e os “velhos de quarenta anos” eram desesperadamente cultuados para transmitir um pouco de sua força e de sua experiência.

Atualmente os jovens estão trombando uns nos outros, em busca de um emprego ou uma oportunidade. Dedicam toda sua força e energia à sobrevivência. Mesmo fortes e produtivos, por vezes nada conseguem. Qual a função dos velhos nesse contexto? Além de alguma ajuda financeira dada pelo dinheiro da aposentadoria e, talvez, de algum carinho, quase nada.

Devemos ser realistas. Devemos ensinar aos jovens o valor do respeito, da gratidão e da generosidade, mas não podemos tirá-los da luta por sua própria vida.

Com os velhos cada vez mais velhos e os jovens mais ansiosos e intolerantes, podemos chegar a uma equação perigosa. A sociedade deve se organizar, as famílias e, sobretudo, as comunidades de idosos devem se organizar. Não há solução padronizada. Para o velhinho solitário, um quarto na casa do filho (ou uma “casa em torno do quarto do pai”) pode ser uma boa opção. Condomínios de idosos tornaram-se interessante alternativa que os americanos descobriram. Os asilos não devem ser satanizados. Existem alguns muito bons, que podem ajudar bastante. O que devemos evitar é que posições fechadas impeçam a discussão do problema e o encontro de uma solução digna.

E, na família onde prevaleceu o amor, ele pode até escassear por uns tempos, mas voltará a vingar.

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