Telefone sem fio (Fiuza)

Telefone sem fio

 

“O tio do cunhado de minha namorada conversou com um alto executivo de um banco estrangeiro e ele garantiu que, se as nossas importações da China superarem nossas exportações, nos arrependeremos amargamente.”

A brincadeira era de telefone sem fio. Éramos sete adolescentes sentados em roda e eu passei a história acima para a amiga sentada à minha direita, sussurrando em seu ouvido. Ela deveria escutar minha mensagem com atenção e repassá-la, também sussurrada, ao próximo amigo. Daí seguia a corrente até que o último da roda revelasse o que havia entendido da mensagem sussurrada pelo penúltimo. Eis que ele revelou, seguro:

“Minha namorada se arrependeu de ter aberto a caderneta de poupança em um banco estrangeiro.”

Não é para menos que tenha havido tanto ruído na comunicação. O entendimento humano já é muito difícil com todas as armas que dispõe, como a entonação da voz, a expressão facial e a postura corporal. Ele fica complicadíssimo se restrito à comunicação linguística. Não é por preciosismo que os escritores lutam por descrever o ambiente e as circunstâncias do discurso de seus personagens.

Você não acredita? Então reproduza a experiência do telefone sem fio com um grupo de amigos. Vai ficar surpreso!

Foi desta forma que eu me senti no começo da primeira reunião virtual com meus confrades da Academia Joinvilense de Letras, nesta fase de quarentena. Tentávamos nos comunicar, mas não o fazíamos. Parecia o samba do crioulo doido.

No final da reunião já estávamos à vontade, como se aquele fosse o nosso meio, desde sempre. Relaxados, até programamos a segunda reunião. Entretanto, lá no fundo, lá no fundinho, ficou um pouco o gosto de … abrir poupança em banco estrangeiro.

 

Ronald Fiuza

 

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