Viagens e aeroportos

Há dois momentos em que me sinto como se fosse um malfeitor. Ambos quando viajo para o exterior.

Viajar é muito bom. Para o exterior, mais emoção ainda. Parece mesmo um sonho, passear por ruas tão diferentes, com aquela arquitetura, aquelas pessoas, vestidas com aquelas roupas, falando aquela língua. Como é fascinante sentar em um restaurante, decifrar menus, ouvir outras músicas, provar iguarias que a mamãe não fazia.

Pois bem, antes de começar essa grande degustação, não posso deixar de me lembrar do início de tudo na manhã da viagem, da expectativa enorme. Lembro-me do momento em que, pensando na aventura do dia seguinte, faço as malas. Trato de conferir tudo, a bolsa de mão, a carteira e a lista de viagem: passaporte, moeda estrangeira, cartões e celulares liberados, plano de saúde, câmera, remédios, guias e mapas, reservas de hotel, roupas de todo tipo. Essa já é uma conferência tensa, um medo danado de esquecer algo.

No aeroporto, a tensão cresce. Se estou um pouco atrasado, então, desespero e atropelo. Depois de fazer o check-in, de olho no excesso de bagagem, passo pela Polícia Federal e caio no primeiro suplício: os raios X. É aquela correria de esvaziar os bolsos, de jogar tudo que é importante naquelas caixas de plástico, de tirar cintos e sapatos, tudo isso pressionado pelos operadores e pela fila de trás. Ao passar pelos raios X e ouvir o apito, eu me sinto bandido pela primeira vez. Noto que os operadores se voltam todos para mim. Sinto que é “contra” mim. Descubro algumas moedinhas no bolso e repito o processo, desta vez dando certo. Corro então para tentar recuperar toda minha tralha, misturada com a de outras pessoas. Tudo com pressa, com a calça caindo.

Finalmente me sento no portão de embarque, sentindo-me um sobrevivente. Depois de me recuperar do sobressalto, tento me relaxar. Não consigo. O alto-falante não para. A locutora não apenas fala o tempo todo, ela grita! E não é só um grito alto, é um grito desesperado: “Última chamada!”. Confiro todas as vezes, para ter certeza que não é o meu. Nunca é.

Em uma viagem para a Noruega me deparei com um aeroporto diferente. Não era grande e logo após passar a porta de entrada havia uma placa que mostrava as regras: “esse é um aeroporto silencioso”. Explicava que todas as informações estariam nos quadros de aviso e que lá deveríamos acompanhar a situação de nosso voo. Não havia alto-falantes, não havia gritos. Meu Deus, um paraíso.

Depois da longa noite com o conforto da classe econômica, chego finalmente ao destino, cansado e amarrotado. Ainda de ressaca da noite mal dormida, vem a segunda situação em que me sinto bandido: a passagem pela imigração. Por que os policiais estrangeiros nos olham com a cara tão feia? As perguntas, sempre as mesmas, vêm carregadas de desconfiança e de tom inquisitório. Respondo com a voz trêmula de recém-acordado e com inglês sonâmbulo, o que faz aumentar a impressão de que sou, sim, um suspeito. O policial olha várias vezes para a minha cara que suplica por um banho, compara com a foto do passaporte, repete impacientemente uma das perguntas e acaba liberando, mal humorado.

Depois vêm os passeios, a música, a comida e eu esqueço tudo. E já começo a planejar a próxima viagem.

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