Como me tornei escritor
Deus, Buda, Alá, Krishna, Maomé, Jesus Cristo ou qualquer outra divindade. Alguém lá de cima. Ou debaixo, dos lados, por quê, não? Quem sabe o destino, o azar ou, vai saber, a sorte. Chame do que quiser, caro leitor.
Alguém (ou algo), ainda não sei dizer e talvez nunca saiba, não me deu o dom da oratória. Convenhamos: eu nunca fui bom em falar. E isso sempre foi uma fixação, porque eu tinha tanta coisa para falar. Tanta coisa para me expressar, tanta revolta para extirpar, que me via aprisionado sem poder me libertar disso.
E foi aí que, quando adolescente, comecei a escrever, num sentimento de liberdade, de pôr para fora o que parecia estar preso dentro de mim. Entre o deitar na cama e o adormecer, minha cabeça era um tal fervilhão de ideias e revoltas, que, não raras vezes, me levantava e escrevia numa folha de papel, guardando dentro de um livro – gesto que aprendi com minha mãe e que me proporciona hoje encontrar escritos antigos no meio de livros.
Também no colégio, principalmente nas aulas de literatura, me via empolgado com os escritos de autores famosos, rabiscava livros com minhas poesias, com pensamentos, enfim, com tudo que me passasse pela cabeça. Tímido, sabia que meu mundo era diferente dos demais, fazendo questão de esconder isso.
Até que um dia, influenciado por meus pais, resolvi não mais esconder aquela vontade de escrever, que se limitava ao meu quarto e meu colégio.
A primeira missiva pública foi em 1998, quando a montadora de automóveis Ford estudava se instalar em Joinville/SC ou em Camaçari/BA. Escolheu a última, como todos sabem. Mas na época havia grande discussão sobre a vinda da montadora e seus impactos, pois o receio de salto populacional e violência, aliados à falta de estrutura educacional e de saúde, iriam piorar a qualidade de vida.
Hoje obviamente esta discussão é inócua, tanto pela vinda de outras montadoras quanto pela referência que Joinville/SC se tornou no polo metalmecânico.
Minha carta foi publicada no Jornal “A Notícia”, o que para um adolescente de dezesseis anos era uma grande conquista. Eu fui visto, enfim. Dos tantos livros que meu pai me recomendava – e eu os lia diariamente – acresci vocabulários que a maioria de meus colegas de mesma faixa etária sequer conheciam. Ali começou meu distanciamento da minha geração. Não parei mais, numa constante velhice literária.
Comecei a escrever cada vez mais cartas e textos, me tornando referência no colégio em que estudava, chegando ao ponto de ser citado para outros colegas de classe como exemplo. Escrevia poesias, contos e muitos projetos de livros – alguns dos quais já pus em prática, outros ainda a fazer.
Percebi que, de fato, esta é a única maneira de viver para sempre: escrever livros. Não há hoje outra forma de se perpetuar no tempo, por gerações e gerações, sem deixar gravado nas folhas suas convicções – estejam elas corretas ou não.
Na faculdade, as escritas só se aperfeiçoaram, de modo a elevar minha monografia à condição de livro ante a intensa e extensa pesquisa feita sobre o assunto escolhido. Sim, meu primeiro livro! Uma alegria e um êxtase sem precedentes em minha vida. Enfim, imortal.
E aí não parei mais. Entre autorias e coautorias, já são oito livros e passei das três dezenas de artigos publicados. Das autorias, dois jurídicos, um de poesias e um de contos.
Atualmente estou escrevendo meu primeiro romance, baseado na história de uma família que conheci. Mas tenho outros projetos que às vezes vejo, penso, reflito e revejo conceitos. Parece que escrevo vários deles ao mesmo tempo, sem pressa de acabar. Meus projetos de livros, lá da época adolescente, ainda estão guardados na memória e nesses escritos.
A fase em que me vejo hoje torna mais complicado escrever, seja pelo ofício que exerço, seja pelos filhos pequenos. Mas não consigo ficar sem pensar em como colocar no papel uma história que ouvi, um pensamento que tive sobre determinado assunto, enfim, sobre tudo.
Afinal, como disse, o que deixamos escrito jamais se apagará.