David Gonçalves – Recepção por Hilton Görresen
Senhor Presidente, senhores componentes da mesa, colegas acadêmicos e demais amigos que nos honram com sua presença:
Quando vim para Joinville, na década de 1970, tornei-me incontinente associado de nossa Biblioteca Pública. Numa de minhas visitas a essa entidade, a diretora, Selma Carneiro, me falou: esteve aqui um jovem dizendo-se escritor e deixou um exemplar de seu livro. O livro tinha por título “As flores que o chapadão não deu”. O estranhamento meu e dela tinha um motivo: naqueles anos era coisa difícil, quase impossível, alguém publicar um livro fora do eixo cultural Rio – São Paulo. Quem seria esse ousado escritor?
Poucos anos depois, convidado pelo saudoso escritor e jornalista Germano Jacobs, fui participar de uma reunião do grupo Cordão, então uma publicação alternativa que fazia sucesso até fora de nossa cidade. Foi ali que conheci pessoalmente o escritor David Gonçalves.
Pelo seu aspecto físico, David Gonçalves aparentava ser nada mais do que um garoto, mas já era detentor do título de Mestre em Literatura, com dissertação publicada em livro.
E fiquei imaginando as dificuldades enfrentadas por esse filho de pequenos agricultores de Jandaia do Sul, no Paraná, que trabalhava na roça até o início de seus estudos universitários, até chegar ao cargo de diretor do Senac-Norte, em Joinville, no qual permaneceu por seis anos, e a professor universitário de Literatura na antiga Furj.
Em casa, no Paraná, não havia livros. Mas pela sua vontade de aprender, começou a frequentar a biblioteca local, devorando grande quantidade de livros, na certeza de que somente o conhecimento seria capaz de elevá-lo do meio rural para um “outro mundo”. Ninguém chega a ser escritor sem ser, antes, um bom leitor. Aos 14 anos “cometeu” seu primeiro texto, o conto “O pote de ouro”, que nunca foi publicado. Se fôssemos nos defrontar hoje com nossos textos da juventude, é certo que morreríamos de vergonha.
Com o entusiasmo e o poder de iniciativa que o caracterizam – e eis o motivo de seus mais de 30 livros –, em 1982, propôs a alguns amigos uma aventura quase inédita na época em Joinville: a publicação de um livro de contos compartilhado. O trabalho de equipe andou tão rápido que no mesmo ano saiu a antologia, se assim podemos chama-la, “Feira de Contos”, com a participação de David Gonçalves, Germano Jacobs, Ives Paz, Luís Carlos Amorim e Hilton Görresen. O lançamento foi grandemente concorrido, com a presença e a palavra de Luiz Henrique da Silveira, prefeito naquela época. Em 1992, saiu nova publicação, “Outros Contos”, dessa vez a cargo da Editora Novo Rumo, de São Paulo.
Hoje, com uma obra consolidada, admirada pelos leitores, David Gonçalves não se afasta de suas origens rurais, traduzindo o drama dos pequenos agricultores que, com a perda de suas terras, migram para os centros urbanos.
Em agosto de 1981 nossa academia, que ainda se encontrava dormitando, “sofreu” mais uma vaga, entre outras já acontecidas. Dessa vez, tratava-se – como já foi explanado – do jornalista, escritor, roteirista e crítico de cinema e, sobretudo, historiador Brasil Görresen, mais conhecido como Brasil Gerson, falecido no Rio de Janeiro, onde residia.
Hoje, nesta solenidade, a vaga de Brasil Gerson está sendo preenchida, e com grande mérito, pelo contista e romancista David Gonçalves.
Sei que o David, com sua modéstia e com seu jeito brincalhão e festivo, não se importa com essas honras acadêmicas, que podem subir à cabeça daqueles que são vaidosos. (Talvez preferisse estar agora num boteco tomando sua cerveja ou discorrendo sobre literatura e “descendo a lenha” nos maus literatos) Mas os seus inúmeros leitores o que irão dizer? Esta academia não pode ser séria se não tem um David Gonçalves, dirão eles.
Mas não foi fácil convencê-lo a se candidatar a uma vaga. Do alto de seus 22 livros de ficção – dentre eles o recente romance “Sangue Verde” – e mais uns 10 de marketing e comunicação, ele não precisa ser consagrado por uma academia. Se aceitou candidatar-se foi com certeza pela amizade aos demais acadêmicos e por juntar-se a esse grupo que representa e procura conservar um pouco da cultura literária de Joinville, preservando a memória de seus antigos escritores, intelectuais e jornalistas.
Bem, só posso agora desejar ao David que seja bem-vindo em nosso meio, com a certeza de que a Academia Joinvilense de Letras só vai se engrandecer com a sua presença, bem como da presença dos outros dois acadêmicos empossados nesta noite memorável.
Obrigado.