Jutta Hagemann (Cristina)

Jutta Hagemann – A guardiã das memórias da cidade

Maria Cristina Dias 

Jutta Hagemann nasceu em 1926, quando Joinville tinha 75 anos de fundação oficial. Mas suas memórias iam além do século 20. Ela tinha uma memória incrível e resgatava as histórias vividas, narradas e escritas por seus pais, avós e bisavós que chegaram à cidade ainda na época da Colônia Dona Francisca, no século 19. Além de conhecer a história oficial, ela trazia histórias de vida, do dia a dia, que não estavam escritas em lugar nenhum até então – e, com isso, foi de fundamental importância para os jornalistas, historiadores e pesquisadores em geral que se propõem a conhecer, entender e divulgar as formas de construção da cidade e da região. E sempre com muita generosidade e disposição.

Ela faleceu em 13 de dezembro de 2018, mas nos deixou um legado de conhecimento e interesse sobre a história da região. Nas próximas semanas vou lembrar aqui, neste espaço, um pouco das histórias que compartilhou comigo, ao longo de vários anos, em inúmeras reportagens.

O texto abaixo é um resumo de sua trajetória, baseado em reportagem desta jornalista, publicada em 2014, no jornal Notícias do Dia/Joinville.

Jutta Hagemann – A guardiã das memórias da cidade

Jutta Hagemann da Cunha nasceu em 19 de junho de 1926, em Joinville. As memórias que guarda e compartilha, porém, são de muito antes desta data. São histórias de família e de vida, que se confundem com a história da construção desta cidade.

Dona Jutta é filha de Gerda (nascida Brand) e Conrado Hagemann. E neta de Engelbert Hagemann, açougueiro, que imigrou para Joinville em 1862, aos cinco anos, trazido pelos pais, Johann Bernand (Fernand) e Elisabeth Hagemann; e de Rudolf Brand, marceneiro de formação, dono da Esquadrias de Madeira Brand, um homem de vasta cultura, que chegou à colônia aos 15 anos, em 1881.

Brand casou-se com Marie Kröhne, que era filha de Julius e Mella Heeren Kröhne. Mella era filha de Friedrich Heeren e Marie Haltenhof, filha do primeiro prefeito de Joinville, Adolpho Haltenhoff, que veio para a então Colônia Dona Francisca no terceiro navio de imigrantes, ainda em 1851.

Dona Jutta teve uma infância como a de tantas outras meninas de sua época, cercada pelos pais, irmãos e familiares. No dia em que completou dois anos de idade, a menina ganhou um de seus maiores presentes: a irmã Margot Hagemann Lepper – a sua boneca, segundo disse seu pai no dia do nascimento da filha mais nova. Tinha ainda um irmão mais velho, Curt, que enchia a casa de música, com seu piano. A família morava na rua Ministro Calógeras e depois se mudou para a rua Conselheiro Mafra, em uma casa que foi demolida para ceder lugar a um prédio.

Embora os sobrenomes fossem alemães, na casa dos Hagemann falava-se o português – ao contrário da maioria das residências de origem germânica. Jutta formou-se contadora no Colégio Bom Jesus aos 19 anos, mas nunca atuou na área. Logo depois casou-se, teve as duas filhas – Maria Thereza e Maria Christina – e foi morar no Rio de Janeiro, onde ficou por cinco anos.

De volta a Joinville, trabalhou na Tupy, na Ambalit e depois na Buschle & Lepper, onde se aposentou oficialmente em 1988. Em 1991, voltou para organizar a biblioteca da Buschle & Lepper e ficou mais cinco anos.

Da mãe, Gerda, herdou o gosto pela leitura, o senso de observação, o interesse pelo mundo ao seu redor. E foi este interesse da mãe, que despertou na filha este apreço pelas memórias de sua cidade.

No final dos anos 70, dona Gerda enviuvou, o que deixou um imenso vazio em sua vida. Nesta época, uma série de acontecimentos fez com que o interesse pela trajetória da família fosse reacendido. A neta Maria Thereza Böbel já trabalhava no Arquivo Histórico de Joinville e sempre trocava informações e tirava dúvidas com a avó. Nessa época, dona Gerda iniciou uma longa correspondência com os parentes distantes, o que deu origem a encontros de família com mais de 200 pessoas e a muitas pesquisas e leituras para levantar as histórias da família Kröhne. Logo envolveu a filha e a neta nessa pesquisa e na organização dos encontros, despertando a vontade de reencontrar a própria história.

Depois que dona Gerda faleceu, em 1989, foi a vez de Jutta continuar a montar o longo quebra-cabeças das lembranças com a filha Maria Thereza, pesquisando nos livros e guardados de sua mãe, resgatando na memória os relatos ouvidos em toda a vida e ampliando sempre seus conhecimentos.

Hoje, aos 88 anos, dona Jutta é reconhecida como uma das pessoas que mais conhece a história do cotidiano de Joinville desde seus primeiros tempos de fundação e, sobretudo, ao longo do século 20. Continua sendo uma leitora ávida, tanto em português em alemão, faz palavras cruzadas e ouve música clássica. Nunca deixa de aprender. Pelo contrário. Com seu computador, descobre os caminhos das novas tecnologias, navega na internet e compartilha informações em redes sociais como o Facebook. Sempre solícita, não hesita em dividir seus conhecimentos e buscar em seu acervo as informações que ajudem a esclarecer pontos da história local e que contribuam para que possamos compreender um pouco da formação desta cidade.

Foto: Jutta Hagemann. Crédito: Maria Cristina Dias

 

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