Peru de Natal (Carlos Adauto Vieira – in memoriam)

 

PERU DE NATAL

Carlos Adauto Vieira (in memoriam)

 

O saudoso Quinote, Aulo Abrahão Francisco, criava gigantescos perus “Meleagris gallopavo”, não para saboreá-los, mas para presentear amigos, à época natalina. Vários ganhei, todos rigorosamente saboreados com a maestria do chef Abelardo Ganancinha, meu  fiel escudeiro por trinta e seis anos, que os preparava, recheava e assava em sua casa, utilizando o prático forno a lenha.

Num dos natais, o peru passou do peso. Veio com 16 quilos e não coube no forno do Ganancinha. Procuramos solução e a encontramos no Clube Joinville, graças à gentileza e disposição do casal Schulz, então seus ecônomos. Aceitaram a tarefa, desde que viesse já limpo e recheado, pronto à assadura, para ser entregue, no máximo, dia 23 de dezembro. Exato! Dia 23 eu já deveria estar em Florianópolis com a minha família. Viria buscá-lo no dia 22, à noitinha.

Dia seguinte, levaria à Capital. Meu pai ficou felicíssimo. Era uma tarefa a menos na sua correria de Natal e Ano Novo.

Devidamente preparada pelo Ganancinha, a enorme ave foi entregue ao casal Schulz.

–  Amanhã à noitinha, doutor! – Foi a advertência da Frau Schulz.

– Sem falta! – confirmei.

E cumprimos o trato. Fui buscar, levei presentes ao casal e lhes quis pagar o trabalho, sem resultado. Nada aceitaram! Aliás, a Frau Schulz nem estava para me receber e me responder à curiosidade sobre a excelência da ave.

Àquela hora sempre havia uma turma de amigos, reunidos no Clube Joinville, fazendo happy hour. Não declinarei nomes. Muitos, hoje, já falecidos. Outros que preferem o anonimato até agora.

Um deles, o Coxinha (Ivan Rodrigues para os íntimos), disse que iriam, naquela noite, fazer um jantar natalino e que gostariam da minha presença. Expliquei que só viera até ali para apanhar o peru, pois viajaria no dia seguinte. Lastimou. Ofereceu-me um uísque, no qual dei um gole e desejando feliz jantar e Feliz Natal a todos, me despedi, carregando a pesada caixa de papelão, onde se encontrava a nossa ceia familiar.

Ao chegar a Florianópolis, meu pai veio curioso ver a magnífica encomenda, tão elogiada por mim. Coloquei a caixa sobre a mesa de refeições, saquei o canivete suíço, cortei as fitas Durex de segurança e descobrimos os seis tijolos, que substituíram o nosso prato-chefe pelo prato-chefe do jantar natalino do Clube Joinville, cujo convite havia recusado.

COMPARTILHE: