Presentes do acaso (Simone Gehrke)

Presentes do acaso

 

– Mamãe, tem um passarinho no meu quarto.

“Como um passarinho ia entrar com o vidro da janela quase fechado? Este menino está ficando cada vez mais esperto para chamar minha atenção quando estou ocupada”, pensei, retornando ao texto sobre educação ambiental que me aguardava na tela do computador.

Dez minutos depois ele volta.

– Mamãe, o passarinho ainda está lá.

Não resisti à curiosidade. Era uma manhã de sábado, um raro dia de sol e céu azul em um fim de semana de Joinville. O trabalho podia esperar alguns minutos.

Tive o privilégio de admirar um canarinho da terra passeando, tranquilo, entre os brinquedos do meu filho.

Quando cheguei ao quarto, ele fazia um reconhecimento do espaço, instalado sobre o ventilador de teto. Depois, conferiu as horas no relógio; apoiou-se na porta para ver o palhaço de papel machê pendurado no teto, descansou no chapéu porta-cabide (um poleiro perfeito) e na barriga de um Bob Esponja inflável. Por fim, pousou na ponta da cama suspensa observando a natureza de um novo ponto de vista. Ou talvez pensando como encontraria o caminho de volta.

Jamais vou saber, de fato, como, quando e por que aquele canarinho entrou no quarto. Mas criei minhas versões, e elas me levam a recontar com prazer esta história, e me alegram ao rever as fotos em que o passarinho, gentilmente, posou para que eu o registrasse.

Expliquei ao meu filho que ele estava ali porque não tinha medo, que os passarinhos das redondezas já sabem que somos confiáveis. “Na sacada daquele apartamento dá para passear, tomar água e voltar para o ninho com segurança”, eles comentam. Disse, também, que ele foi atraído pelo colorido do quarto e pela paz que podia sentir neste lugar.

A visita inesperada foi um presente do acaso. Como muitos outros que a vida nos reserva, mas às vezes passam despercebidos por não termos tempo para apreciá-los e distrair o espírito fazendo conexões com outros fatos do nosso dia.

Só vi o passarinho porque deixei o trabalho para mais tarde. Ironia do destino, troquei a teoria da educação ambiental pela sua prática e retomei o meu texto com a alma leve e inspirada.

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