A mulher braba do baile (Milton)
AS MULHER BRABA DO BAILE
Poema de humor gaúcho
MILTON MACIEL
Diz que criança e borracho,
Deus anda com a mão por baixo.
Pois é verdade, asseguro,
Eu mesmo vi e le juro!
Pois o maula do Antenor,
Depois de tomá umas canha,
Resolveu sacudí as banha
Num baile que, por favor!
Que lá só tinha borracho,
Uns flocho metido a macho,
E um gaitero que é um horror.
O índio, sempre mamado,
Só tocava tudo errado
E errado o povo dançava,
Só que tava acostumado,
Tanto que nem reclamava.
Bueno, acontece que as china
Já não era mais menina:
Umas piguancha velhusca,
Que chegaro, as seis, num fusca,
Pra vê se arranjava macho.
Levaro foi um esculacho,
Que o Antenor, de cara cheia,
Chamô umas duas de feia
E as otra de gorda e véia.
Pra quê? O caldo entornô!
A mulherada se armô,
Pegaro o Antenor de jeito!
Deram nas fuça e nos peito.
Deram nele de chicote,
De madera de caixote
De bainha de facão,
De chute de botinão.
E levou tanto planchaço
Com facão de duro aço,
Que ali mesmo ele arriou.
Só que tava tão borracho,
Pelas canha que tomô,
Que até apanhando foi macho,
Pois dormiu e até roncô.
As seis piguancha era braba:
Veja só o que se passô:
Co’a boca escumando baba,
Nem bem a poera baixô,
A mais alta se enfezô!
Passô a mão num porrete
Deu chute nos tamborete,
E começô a dá pancada.
De raiva, não via nada:
Quebrô metade da venda,
Cinco peão de uma fazenda,
Dez garrafa de cachaça
E um que ria, achando graça.
“Vai ri da tua avó torta,
Me respeita, se comporta,
Seu filho de chocadera.”
Pois o índio fez a bestera
De partí pra cima dela.
Ele quebrô seis costela,
A perna, o joelho e o nariz.
No fim se deu por feliz
De apanhá só esse tanto,
Pois, pra seu maior espanto
No Antenor, que dormia,
As otra cinco batia.
Mas sorte teve o Antenor:
Ele estava tão borracho,
Que Deus pôs a mão por baixo,
Pois, nesse exato momento,
Chegô um destacamento
Da Brigada Militar,
Que o dono mandô chamar.
Entraro, tudo montado,
Pelo salão apinhado,
Descendo a espada nas china.
Mas as piguancha era braba
E quase que a briga acaba
Com todo mundo ali morto.
Oiga-le entrevero torto!
Brigaram por mais duas hora,
Depois alguns foram embora
E os que ficaram, cansaram.
Pelo chão se esparramaram,
Que tinham que descansar
E também que algo tomar.
Ai correu solta a cachaça,
Litros e litros de graça,
Que o bulichero dormia.
Depois, levantaro as guria,
Que a noite ficando fria,
O remédio era esquentar.
Mandaro o gaitero tocar
E foram tirá os soldado,
Que tava meno estropiado,
Pra mode todos dançá.
E já se alegraro as piguancha:
A vanera correndo ancha,
Todo mundo fez as paz.
Dançando tudo agarrado
As piguancha co’s soldado,
E as moça com os rapaz.
Mas me diz se tu é capaz
De acreditá nisto aqui:
(Nem pense que le mentí):
Sabe a piguancha graúda,
A que quebrô quase tudo,
Índia braba que é um horror?
Agora é mansa a parruda,
Veja que fim macanudo:
Hoje é a mulher do Antenor!