Ac. Apolinário leu “O futuro do capitalismo”, de Paul Collier
O Futuro do Capitalismo
– Apolinário Ternes
- Todos sabemos que o capitalismo vem incorrendo em erros. Graves erros que estão conduzindo o mundo a situações dramáticas e radicais. A questão da imigração é uma delas, e que incomoda não apenas a Europa e os Estados Unidos, mas também a África e a Ásia. É uma questão global, portanto. A imigração é o resultado mais explícito do não funcionamento do sistema capitalista que, além disso, enfrenta outros desafios e de gravidade ainda maior. O meio ambiente, o consumismo, o enriquecimento de poucos e a extrema pobreza de muitos.
Neste mar de perguntas sem respostas e de um mundo sempre mais à beira de um precipício, muitos são os economistas, filósofos, pensadores da academia que estão produzindo análises e comparações, propondo soluções e caminhos. Paul Collier, da Universidade de Oxford e do Banco Mundial, acaba de avaliar o cenário da modernidade em seu bem pensado
“O Futuro do Capitalismo- enfrentando novas inquietações’. Trata-se de um economista com ampla base intelectual, além de décadas de ensino e outras tantas de artigos publicados nos jornais mais importantes da Europa e Estados Unidos. Collier é, de fato, um conhecedor do assunto e o seu livro é de 2019, publicado no Brasil pela L&PM, de Porto Alegre.
A síntese da obra pode ser facilmente encontrada na ‘orelha’ de abertura: ‘Todos sabem que o sistema econômico capitalista e sua contraparte política – a social democracia que caracterizou a maioria dos países desenvolvidos do Ocidente nas últimas décadas – estão em crise. Mas poucos têm uma visão tão aguçada de como chegamos a tal colapso quanto o economista do desenvolvimento britânico Paul Collier.
‘Profundas fissuras estão esgarçando o tecido de nossas sociedades: metrópoles dinâmicas versus o interior; os mais instruídos contra os menos instruídos, países ricos versus países em desenvolvimento. Tais rachaduras têm se agravado com o tempo e nós perdemos o sentimento de coletividade e de obrigação ética para com os outros que foi tão crucial para o boom econômico da segunda metade do século XX’.
O resultado da crise ética do nosso tempo, nos conduz a sociedades sempre mais despedaçadas em radicalismos de toda ordem. Não apenas entre nações, conduzidas por líderes radicais de direita – como no Brasil e nos Estados Unidos, além de Itália, Hungria e Turquia – mas também em democracias mais antigas e conservadoras, como Inglaterra e França. Em todos os cantos, o mal estar advém da redução da ética a níveis inaceitáveis.
As relações econômicas fundadas em princípios egoístas que superam em muito o bom senso da ‘mão invisível’ de Adam Smith, põe o mundo em guerra permanente, com restrições ao livre comércio que podem conduzir a todos a um beco sem saída. Afinal, onde está mesmo a saída? Collier não reconhece que o livre mercado pode oferecer algum tipo de entendimento ou de solução. Pelo contrário, propõe que haja compartilhamento e ética nas relações econômicas, pragmaticamente defendendo o reconhecimento de que os caminhos do crescimento precisam estar limitados por valores de pertencimento e de responsabilidades divididas. Isto é, um crescimento com ética, a partir do reconhecimento de que todos merecem participar da divisão, e não apenas os ricos se tornarem mais ricos e os pobres sempre mais marginalizados.
O capitalismo é o único sistema capaz de gerar riqueza e prosperidade em massa, e o ‘que tem acontecido ultimamente não é intrínseco ao capitalismo, mas uma falha de funcionamento que pode e deve ser corrigida’, defende Collier.
Na proposta do livro, Paul Collier defende nova reestruturação das sociedades, sempre empenhado na construção de um Estado ético, de uma empresa ética, de uma família ética e de um mundo ético. As nossas instituições da família à empresa, das cidades às universidades, precisam refazer os pactos antigos em bases renovadas de solidariedade, respeito humano, na edificação de vidas mais valorizadas e menos ásperas.
O capitalismo talvez seja um caminho possível, assim como o socialismo nunca será possível, mas é preciso corrigir os seus caminhos, refundar os princípios éticos, limitar o lucro, taxar fortemente as fortunas, criar novas obrigações para as aglomerações urbanas e sítios industriais, recuperar as cidades, reduzir as frotas de veículos motorizados e ampliar os serviços públicos de transporte. Valorizar os bens intangíveis ligados à arte, ao belo, às humanidades, recuperar a estética das nossas cidades e romper com todos os extremos. Reposicionar a política, modernizar os processos eleitorais e limitar as funções do Estado, que deve em todos os lugares e sistemas, conhecer profundas mudanças operacionais, com exaustivas limpezas burocráticas e reduções drásticas do número de servidores. A burocracia é um mal do nosso tempo e vem acabando com o Estado, tornando-o um Leviatã infernal, perdulário e consumidor de todos os orçamentos. São caminhos possíveis para consertar o capitalismo e colocá-lo a serviço da humanidade e não como instrumento para tornar os ricos mais ricos e os pobres mais desesperados, como tem acontecido ao longo das últimas décadas.