Andarilhas na Vila do Conde (Nelci)
Andarilhas na Vila do Conde
Pense num grupo de mulheres de diferentes idades enfrentando uma estrada de chão, extremamente poeirenta pela longa falta de chuva, que impregnava de pó as roupas, os cabelos e se infiltrando por todos os poros. Descabeladas, a pele, próxima a cor de ébano, com linhas brancas e sinuosas no rosto, por onde haviam corrido lágrimas de tanto rir. Assim elas chegaram à casa de nosso irmão Verno e esposa Ana Maria, na Vila do Conde, município de São Jerônimo, Rio Grande do Sul.
Verno e Ana Maria há pouco tempo haviam-se mudado para uma chácara na Vila Porto do Conde. Nas férias subsequentes receberam a primeira visita: Mamãe Guilhermina, Irani, Noeli, Malu, Letícia, Larissa e Liudmila; as três últimas entre 5 e 10 anos.
Com saída da casa de Guilhermina em Bom Princípio, o trajeto era longo e pouco conhecido pelas viajantes. O transporte disponível, a Saveiro com capota adaptada, da Gráfica Dominó, com Irani de motorista e Guilhermina de acompanhante na cabine.
As demais cinco se acomodaram na carroceria. Tudo fechado, por segurança e por proteção contra a poeira da estrada, que não diferia muito de um caminho de roça. Porém, segundo algumas mentes brilhantes encurtava a quilometragem.
Pleno verão, o calor se tornava ainda mais sufocante com as chacoalhadas da caminhonete. Sentadas no chão sem apoio, rolavam da direita à esquerda, ida e volta. Caiam, rolavam e gargalhavam. Contam que Guilhermina sentada na cabine reclamava da baderna que se desenrolava na “cozinha do navio”. Ela nem imaginava o que lá acontecia…
Vislumbrando uma luz no fim do túnel para dar vazão ao calor, as passageiras dos fundos abriram pequenas frestas para arejar o calor. Bem, o que é pior: o calor ou a poeira. Decidiram ficar com a poeira que, com o arzinho pelas minúsculas aberturas entrava aos borbotões. Porém, havia também o lado trágico, ou seja, tragicômico.
De bermudas e sandálias rasteiras, as cores da pele e da roupa foram transmutando de forma mágica. Escurecendo, ressecando, como se fossem andarilhas em dia inteiro de caminhada sob o sol. Malu e Noeli riam uma da outra, pela rápida transformação de suas aparências. Os cabelos, arrebitados em todas as direções, parecendo certo tipo de galinhas de penas estropiadas. Enquanto isso, a pequena Liudmila rolava e rodopiava pelo chão da carroceria como um peãozinho.
Ao chegarem à casa de Verno, Guilhermina ainda tentou repreendê-las pela folia durante a viagem, mas parou na metade de sua fala. Ficou sem palavras ao olhar para as filhas e netas de cabelos eriçados e “pintadas” de cima abaixo na cor marrom, quase chocolate. Os anfitriões ao vê-las, antes de abraçá-las também entraram na avenida das risadas.
As visitantes, antes de qualquer ação procuraram um banho, para depois engendrar conversas normais entre visitas e visitados.
No retorno a Bom Princípio tomaram outro roteiro, mais longo e mais qualificado. Contudo, elas afirmam que essa viagem foi uma das mais intensas aventuras de férias de suas vidas.
Nelci Seibel
Joinville, 23.8. 2016