Conversa com Pedro (Zabot)
CONVERSA COM PEDRO
Pedro é meu neto. Mas poderia ser neto de qualquer um. Quem não curte seus netos. Sementes do amanhã. Pedro, no entanto, é diferente; tem medo de ovelhas, embora dez anos nas costas. Ora Pedro… Medo de ovelhas que ousam afrontá-lo deliciando-se. Elas, no entanto, nem aí, pois mais deleitam-se com as gramíneas ao largo. Dóceis, e à toa por ali, apenas achegam-se para um cafuné. Erguem-se à dispersão do acaso. Tempo de férias. Carentes elas…cadê os alunos? Pedro não entende assim, embora minha insistência: – São mansas Pedro. Abrace-as, pois deixaram de pastorear para recebe-lo, ó ingrato príncipe das Astúrias!
Naquela tarde ousamos percorrer as unidades didáticas da Escola Agrícola Carlos Funke, em Pirabeiraba. Escola de tempo integral. De dia inteiro. Escola modelo. Turmas da 6ª. a 9ª. série do ensino fundamental. No IDEB está no cimo, segundo lugar. A escola não surgiu por acaso. Joinville, de longa data, sempre investiu nos Clubes Agrícolas Escolares – raiz robusta erigi-la.
Na visita, de cara, aves de postura. Um bando delas cacareja. Nos recebem com imensa galhardia. Ciscam faceiras. Bicos alongados, porém, aparados revelam sustação do contencioso. E não desmentiam porque ali estavam… ninhos lotados de ovos.
Seguimos em frente: o meliponário – abelhas sem ferrão: jataís, uruçus, iraís, mandaçaias, guarupus, entre outras. Caixinhas do encanto. Pródigo abrigo. E até numa garrafa pet coberta por plástico escuro, exibiam-se.
Embora em férias, tudo na escola reflete aconchego. Transluz. Mas como o inço cresce, senhor Deus! É verão, não poderia ser diferente. Sufoca o alho, sufoca o aipim, não consegue, porém, sufocar o milho. Este escapa… pendões ao vento, espigas vistosas.
Adiante, viveiros transbordam. A primeira estação de piscicultura de Santa Catarina, encanta. Água pura da serra jorra para deleite das tilápias.
A trilha nos conduz aos fundos do sítio, área de ensaios com cana-de-açúcar. Cultivares em quarentena. Provoco Pedro: – Que lavoura é essa? À frente, escoradas, trepadeiras. Folhas largas. Oh, não! Não tem obrigação de saber. Mas em se tratando da estrada Mildau, e encoivaradas, só poderia ser o famoso cará. Por ali, a festa do cará marcou época. Sociedade Mildau. Planta nativa, ingrediente mais do que perfeito para a fina gastronomia: panificados e doces.
À beira do caminho, um monte de seixo revela a fúria das águas. Ao longo dos séculos debulham a serra de alto abaixo – desmoronamento do morro da Tromba.
Retornando nos deparamos com um bode. Esbelto animal. Esbranquiçado. Barbicha desgrenhada. Chifres dobrados pra trás. Orelhas abanando. Furioso largava berros de descontentamento. Algum maluco o afastará das cabras; percebia-se claramente isso no seu olhar inamistoso de amargor e desalento. Choro contrariado de bicho tinhoso.
A escola, ressalte-se, caracteriza-se por acessos calçados, o que facilita o trânsito “in loco”. Dobrando à esquerda, uma lavoura de pitaia amarela, lotada de flores, exibe-se. Pródiga florada. Frutos em formação. O coelhário, mais ao fundo, desperta Pedro. Refestelam-se os coelhos. Folhas de rami, abundam; dosam-nas com pitadas de ração.
Ao lado, no lago, um aerador esguicha água, parece anunciar presença de vida por ali. Na estação, alguns tanques vazios. Nem tudo são louros, obviamente.
De qualquer forma Pedro vibra. Diante do que percebe, enche-se de entusiasmo. Quer porque quer estudar na escola agrícola. – Ah, Pedro, essa é outra história. Torço por ti, mas há seleção. Há critérios. Pedro entende, e apoia. – Vô, não quero atrapalhar a vida de ninguém, mas confesso… Amei demais este lugar. E se Deus quiser, vou cuidar daquelas ovelhas.
A Escola Agrícola doutor Carlos Funke para quem não sabe é uma grata revelação de como é possível, mesmo num centro industrial como Joinville, conciliar campo e cidade. Ou seja: despertar luzes na ribalta. Despertar a juventude para as lides do campo.
E saber que nasceu de uma viagem a Brasília, 1986. Que o diga Dario Salles, o protagonista. Somos testemunhas, pois também estávamos lá. Provocação do Ministério da Educação, então sob a batuta de Jorge Bornhausen.
Ressalte-se, no entanto, sem a ousadia dos técnicos Mário de Aguiar e Iria Vicznevski nada teria acontecido. E o empurrão final, sejamos realistas coube ao prefeito Luiz Gomes, e à ousadia do agrônomo Eni Voltolini, então presidente da Fundação 25 de Julho. Alvissaras!
Joinville, 28 de janeiro de 2020
Onévio Zabot