Joinville na época das diligências (Paulo Roberto da Silva)

 

Joinville, na época das diligências

Paulo Roberto da Silva

 

No ano de 1857, um jovem alemão do norte, contando com apenas 28 anos de idade, decidiu imigrar para o Novo Mundo, e a nascente Joinville foi o seu destino. Administrador na sua terra de origem, o grão-ducado de Mecklenburg, nascido na cidade de Schwerin, a capital, e filho de um pastor luterano e reitor de uma instituição de ensino, muito se questiona sobre os motivos que o levaram a imigrar. Talvez por mero espírito de aventura? Talvez por um romance com uma jovem suíça que tenha desagradado a família? Tudo é possível.

O fato é que, aqui chegando (após mais de 2 meses de viagem pelo Veleiro “Trident”) e adquirindo uma propriedade na atual rua XV de Novembro, logo se adaptou à terra estranha, apoiando a Sociedade Atiradores de Joinville e ingressando na loja maçônica local, duas das nossas mais antigas sociedades, ambas fundadas em 1855 e ainda hoje existentes.

Em 1858, estando no Rio de Janeiro, então capital do Império do Brasil, obteve a autorização para explorar o serviço postal por meio do emprego de estafetas. Essa etapa de sua vida foi o trampolim para algo maior que surgiria duas décadas depois.

Nesse meio tempo, naturalizando-se brasileiro, ingressou na política, filiando-se ao Partido Liberal e conseguindo se eleger para 4 mandatos como vereador, num período que iniciou em 1869 e encerrou em 1887. Nesse ínterim, em 1877, assumiu a condição de 5º prefeito de Joinville por curto período.

A partir de 1881, enfim, o imigrante Carlos Monich criou uma “Empresa de Diligências” que, mediante autorização do governo provincial (atual governo estadual), passou a transportar passageiros no trajeto Joinville-São Bento-Joinville, vindo a englobar também a condução das malas postais. A primeira viagem aconteceu em 07 de setembro de 1881, há mais de 140 anos, após um efusivo discurso proferido por seu amigo e padrinho de casamento, o Dr. Carlos Lange.

Diferentemente daqueles veículos mostrados nos filmes de faroeste norte-americanos, as diligências empregadas em Joinville eram inspiradas no modelo alemão, denominado de “Kremser”, consistindo em pesadas carroças sem portas laterais mas com uma única portinhola nos fundos, por onde os passageiros subiam através de uma escada de metal e ocupavam os bancos que formavam um grande “U” na parte interna. Na frente, na boleia, situada num ponto mais elevado do veículo, seguia o cocheiro e mais um passageiro ao seu lado, se fosse o caso. A bagagem era transportada sobre o teto do veículo. Logo à frente do assento do cocheiro havia uma grande caixa onde era armazenada a mala postal.

O trajeto, de cerca de 80 km entre Joinville e São Bento, levava… 2 dias inteiros de viagem! Partindo do Hotel Beckmann, localizado na esquina das Ruas do Príncipe com XV de Novembro (no lugar onde, até recentemente, esteve instalado o “Banco Safra”), as diligências percorriam os primeiros 20 km quando, então, paravam em uma estalagem para almoço e descanso ou troca dos cavalos. Após o almoço, mais 20 km e paravam em outra estalagem para pernoite. No dia seguinte, outros 20 km, com parada para almoço e, na sequência, os 20 km finais quando, enfim, todos chegavam a São Bento no fim da tarde.

Para o trajeto inicial da viagem eram usados 2 cavalos, podendo chegar a 4 ou até 6 nos trechos de subida da serra e quando o veículo estivesse com lotação completa. Como os cavalos usavam guizos ao redor do pescoço, os moradores sabiam previamente da chegada dos passageiros e da mala postal pelo som característico que era ouvido, sem contar a presença de um postilhão que, munido de uma corneta de metal, seguia um pouco mais à frente, a cavalo, anunciando que a diligência estava a caminho.

Até onde se sabe nunca houve um acidente fatal nos cerca de 30 anos em que esse serviço foi prestado, sendo que, a partir do ano de 1900, o velho empresário Carlos Monich se afastou, sendo substituído pelo filho Harry, que prosseguiu até cerca de 1910, quando o serviço ferroviário assumiu essa atividade de transporte, inviabilizando a continuidade das diligências.

Na ilustração abaixo, que aparece no livro “História de Joinville”, de Carlos Ficker, uma amostra de como era a diligência e o primeiro anúncio publicado no jornal “Kolonie Zeitung”, de Joinville.

A partir de 1893, uma nova linha se seguiu à primeira: desta vez com a chegada da primeira diligência da Empresa Monich em viagem direta de Curitiba a Joinville, aqui sendo recebida festivamente após um percurso realizado no tempo (considerado “recorde” pela imprensa da época) de… 7 dias e meio!!

Esse pioneiro da época das diligências foi meu tetravô materno e faleceu em 1906, em Joinville, estando sepultado no Cemitério do Imigrante. Em um ano como este, de 2024, em que se comemora os 200 anos da imigração alemã para o Brasil, recordar a trajetória dos nossos antepassados imigrantes é reverenciar seu esforço e valorizar seu legado.

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