Oração de um poeta à beira do berço (Elizabeth Fontes)

 

Oração de um poeta à beira do berço

Elizabeth Fontes

 

Menino Jesus,

Estou diante de sua presença frágil, neste berço que é tão somente palha, lençóis e carinho de sua mãe.

Encanto-me diante do mistério.

Encontro sua grandeza na minha fragilidade, vendo você tão pequeno ao mesmo tempo sabendo que é Deus. E reconheço-me como um ser de coração apertado, diante desse rito que sempre me põe de joelhos.

Neste silêncio que é só nosso, quero apenas respirar a pureza do seu mistério divino e humano, neste encontro que temos a cada ano.

Todo dezembro você se torna assim. Pequenino. O menino para quem canto todas as canções aprendidas na infância, pensando em anjos e pastores, estrelas e reis, palha e presépio, incenso e mirra.

Nesta noite em que você está aqui de novo, e que eu posso contemplá-lo como sempre fiz em todas as noites de Natal, deixe-me somente ficar em silêncio, debaixo de seus olhos.

Deixe que meu coração deposite aqui todas as inquietudes da minha caminhada.

Deixe-me dizer em prece, o quanto tenho estado distante da minha fé e o meu pedido de desculpas… Tenho usado todo o meu tempo nas palavras escritas para tecer poemas, para contar livros e costurar destinos. Em meu labor de estender no papel rios e céus, flores e pores de sol, não coube lugar ainda para escrever agradecimentos a seu Pai…

Eu reconheço que Ele é quem sopra os poemas aos meus ouvidos. Ele que borda com letra bonita no meu pensamento, o devo dizer às crianças, e me faz escrever as coisas que enchem olhos e corações de alegria, dentro das páginas dos livros.

Eu queria então que Ele soubesse, por você, da minha gratidão.

Olhando para suas vestes brancas e essas mantas tecidas de afeto pelas mãos de sua mãe, encontro minhas próprias mãos vazias.

Não tenho nada para lhe oferecer de valor.

Tenho somente uma oração guardada na memória e as palavras que escrevi nestes livros que ora deposito aqui, perto de seu berço-manjedoura.

Tenho também o tempo para estar em sua presença e ouvir aquilo que quiser me contar agora. Porque hoje, quero escutar o que aqui sempre ecoa neste presépio tão antigo; e agradecer as bênçãos debruçadas sobre minha vida diante da luz que seu nascimento traz a cada ano.

Perdoe-me se eu chorar, porque você sabe que eu sempre me comovo com seus olhos de criança, com toda a candura que cabe dentro deles e com todo amor que, sei, se espelha para mim.

Você me vê com olhos de compaixão e doçura. E eu, olho para você com olhos de silêncio e prece, entrega e pertencimento. Neste diálogo amoroso sem palavras, nós dois nos encontramos e eu lhe reconheço como divino.

Sendo assim, peço que continue por mim atento, cuidando da minha criança interior.

Cuide da minha criança como fosse um brinquedo seu, guardado junto a seu peito, tomado por suas mãozinhas feito objeto precioso.

Cuide também de mim. Dos meus poemas, das flores da minha alma e dos canteiros de sorrisos que me habitam.

Cuide da minha esperança semeada em meus dias. O meu coração que é a casa dos meus olhos. As minhas mãos de escrever no correr do tempo.

E eu, por minha prece singela, quero ser cada parte do seu presépio nesta noite: o boizinho para lhe aquecer, o jumentinho para lhe carregar, a ovelhinha para lhe encantar. A manjedoura para colocá-lo em meu colo.

E por fim, se me der de presente, eu aceito um fragmento de sua estrela, para que eu possa também tornar-me parte refletida de sua luz.

Que assim seja, meu menino Jesus.

Amém.