Sepé Tiarajú falava castelhano (Lufiego)

SEPÉ TIARAJÚ FALAVA CASTELHANO

Nos tempos antigos, enquanto imaginávamos a vida ideal que queríamos para todos, embalados pelos sonhos e fantasias que vieram de um movimento simbolizado por Woodstock (1969), sons vocabulares ecoavam em certas entranhas saturadas do desejo de se manifestar ao mundo. Encontros vocálicos e consonantais que precisavam ser expelidos para se colocarem como sujeitos desvencilhados de mil e uma máscaras. Agentes pouco conhecidos, atuantes sobre a brancura fria do papel; células-tronco formadoras de intrincados labirintos. Estradas perigosas por onde transitava e transita a condição humana; gotículas de sêmen escorridas pelas dobras adiposas das mulheres-mariposas nos sobrevoos inconsequentes nas cabeças dos homens-mariposas. Seres irresponsáveis, que agem impulsionados pela ilusão de que cobrirão o mundo, pensando que os dias serão eternos. Homens e mulheres-cigarra, na verdade! Os homens são meros mortais e o que existe de eterno é a busca constante por respostas para explicar uma vida obscura e caracterizada pela expansão inexorável do Universo. Energia escura que atua aumentando o vácuo entre os mundos.

Esta redação, entretanto, e acima de qualquer vaidade ou ponta de orgulho, é a busca sedenta e apaixonada pelo tilintar dos grupos de letras, sílabas, palavras, termos, frases e parágrafos, que pedem licença para ter forma própria, onde a razão não esteja sozinha, mas acompanhada de um influxo subjetivo e misterioso, proveniente de algum lugar impreciso, situado entre o cérebro e o coração. Logo, não representa nenhuma tese acadêmica, muito menos algum tipo de lição para a vida ou fábula disfarçada de prosa com sentido moral, liberados que estamos pelo advento do princípio da mais ampla liberdade de dissertação, ou seja, não existem limites que cerceiem a nossa liberdade literária, salvo os decorrentes da incapacidade de expressão, porque então a limitação, sem uma fonte externa auxiliadora, se mostrará absoluta e insuperável. Érico Veríssimo, Machado de Assis e Euclides da Cunha passam a ser releitura obrigatória para ampliar nossa capacidade de redação. Não esqueçamos de Carlos Nejar, de Guimarães Rosa e do passarinho Mário Quintana! Não esqueçamos, pois, considerada a evolução natural da língua ao longo de cinco séculos, eis que se apresentam as fontes primárias para percorrermos às qualidades do idioma de Pero Vaz de Caminha.

 

– Não, Sepé Tiarajú não falava português; falava guarani e, considerando que seus gurus eram jesuítas espanhóis, aprendeu a falar a língua de Cervantes. De qualquer forma é um grande herói para os Gaúchos. Pergunte lá em São Gabriel (RS); lá, Sepé virou Santo! E quanto ao Alegrete, não me perguntes onde fica, “segue o rumo do teu próprio coração[1]”.

 

[1] Verso extraído da canção CANTO ALEGRETENSE. Trata-se de uma obra clássica da música nativista riograndense, apresentada pelo cantor Neto Fagundes em 1983 na 3ª. TERTÚLIA MUSICAL NATIVISTA DE SANTA MARIA. Jair Kobe, criador do Guri de Uruguaiana, imortalizou a canção a partir de paródias de músicas famosas, usando a letra do Canto Alegretense.

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