Surpresa

A curiosidade fez incríveis revoluções na história da humanidade. Sem a curiosidade, estaríamos ainda andando aos solavancos dos quadrados! E foi a curiosidade que moveu Alceu desde o começo. Desde bebê pra ser mais exato. Não era só uma coisa de receber respostas: era de ver para crer! Nisso descobriu a força da eletricidade ao enfiar o dedo na tomada. “Não bote o dedo Alceu, porque dá choque”… e dava mesmo. Cresceu Alceu provando as maravilhas do porquê das coisas, e queria saber o que fazia o marido da vizinha com seu tio todas as segundas-feiras, o que a mãe falava com o homem esquisito ao ficar sozinha com ele na salinha de madeira, o que continham os ramos de arruda que a benzedeira balançava sobre seus machucados. Eram mistérios que ele não conseguia revelar. Recebia explicações nunca suficientes. Alceu gostava apenas de saber o que havia por detrás das coisas. Por baixo delas. Adorava retirar o véu acobertador.

A curiosidade fez com que Pandora espalhasse todos os males no mundo! Alceu sabia disso. Aprendeu nas aulas de história, mas foi nas aulas da vida que descobriu tantas Pandoras por aí, carregando caixas e mais caixas de outros sortilégios para tentar os olhos dos outros, e assim diminuir os seus problemas de consciência por distribuírem maldade no mundo. Foi assim que descobriu que a moça da rua de baixo na verdade era um moço. Foi a curiosidade que o levou a seguir uma namorada depois do emprego e descobrir que ela era a pessoa mais reta possível: ao esticar-se toda para beijar o cara de 1,83 com quem o traía. Alceu viu naquela tarde que a curiosidade seria sua aliada. Pena que junto das descobertas não vinham só maravilhas, haja vista a descoberta do avião que trouxe a aproximação mas também levou as bombas lá pra cima.

A curiosidade fez com que o mundo fosse desbravado. Isso aprendeu Alceu com a professora Alcenir, nas aulas de geografia. Foi o que o instigou a descobrir o que haveria depois da montanha que circundava a sua cidade. Para lá ninguém nunca fora. Era longe, alto, estranho, inóspito, talvez terrível! Todo mundo ia para o outro lado, onde o mar se abria. Ninguém quisera, e assim foi nunca, descobrir o que tinha depois da montanha. Mas Alceu queria! E foi. Sabia que a coisa mais linda do mundo estava por se abrir. Ruas de ouro, casas de seda, luas de vidro, selvas de areia, bolas de aromas, gente-bandeira, gatos-estrela, sombras calientes, sobras de leite, mãos jogando pedras à beira dos rios. Imaginou cada pedaço do que viria: a relva, a selva, a névoa…e quando chegou ao topo, soerguido pela alegria de descobrir que a curiosidade era uma mola propulsora a levantá-lo, olhou, de olhos arregalados, e teve a surpresa.

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