A casa do joão-de-barro e os recomeços

Há pouco mais de dois anos eu olhava por uma das janelas do meu apartamento com os “olhos de ver” e me deparei com um casal de joão-de-barro que estava construindo seu novo lar.

Pacientemente, a cada dia eles levavam no biquinho um pouquinho de barro úmido para cima de um poste e iam empurrando, moldando a casa. Um exercício de persistência e paciência de quem sabia que valia o esforço para construir um lugar para ter a sua cria com segurança.

Mas segurança é um conceito relativo até para os passarinhos. E algumas vezes flagrei outros pássaros pousando na casa do joão-de-barro sabe-se lá para quê.

E eu, que às vezes acho que não tenho nada para fazer nessa minha vida tão atarefada, todos os dias de manhã cedo tirava uns minutos para fotografar a evolução da obra. Foram mais de dois meses de labuta diária. Os novos vizinhos ergueram uma casa bonita, com uma entrada estilosa. Já as minhas fotos deram origem a um vídeo feito com a ajuda de um amigo querido.

Mas um dia, eis que veio uma tempestade. Um vento forte daqueles que uivam ao passar pelas frestas da janela levou o sonho do casal de joão-de-barro poste abaixo. A chuva forte lavou o que restou dos escombros e não sobrou nem o alicerce para contar história.

Os dias seguiram  , porém, um após o outro. Novamente a primavera se aproximou e surgiu a necessidade de um lugar para abrigar os filhotes. Os primeiros já haviam saído de casa bem antes da tempestade, deixando o ninho vazio.

Se o casal de joão-de-barro teve dúvidas sobre o que fazer, eu não saberia dizer. Mas um dia olhei pela janela e lá estavam os dois passarinhos de novo, erguendo diligentemente a sua nova morada. Sempre levando o barro úmido no biquinho, dia após dia, com paciência e tenacidade.

Desta vez, porém, o vento e a chuva chegaram mais cedo e a casa se desmanchou antes mesmo de ser totalmente reconstruída. Para onde foram os passarinhos, eu não sei. Mas já não estão mais lá. Talvez tenham ido buscar um poste mais abrigado das incertezas climáticas. Ou, quem sabe, estão esperando para recomeçar mais uma vez no mesmo lugar.

Mas como nada na vida é em vão, eles ratificaram a minha certeza de que essa vidinha é repleta de recomeços e de que precisamos estar preparados para isso. Em uma hora tudo parece indo tão bem. Os planos se concretizam conforme desejamos, os amores são quentes e para sempre, os dias têm aquela tranquilidade que dá paz à alma. De uma hora para outra, porém, o vento passa uivando alto e bagunçando o que parecia tão certo e perene. Leva até os alicerces e nos obriga a construir tudo de novo.   E, assim como o casal de joão-de-barro, saímos por aí em busca de barro úmido e bom para, mais uma vez, recomeçar.

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