A JABUTICABA PAGOU O PATO

O noticiário político-econômico tem vocabulário próprio, com frequentes referências à fauna e à flora. De tempos em tempos, compara-se o crescimento brasileiro ao voo da galinha, as singularidades da legislação ou do modus operandi do país à jabuticaba e as vítimas de alguma situação institucional aos patos.

A galinha, de fato, tem um voo que difere da maioria dos pássaros: curto, passageiro, sem rumo, errático, nunca se sabe onde vai terminar. Qualquer semelhança com os poucos  levantares e os muitos despencares da atividade econômica não será mera coincidência.

O pato, coitado, já era vítima no além-mar antes de fazer parte das manchetes dos jornais (ou de virar personagem da Fiesp). Pagar o pato é fazer papel de bobo, arcar com consequências dos erros alheios. A origem da expressão remonta a um jogo português em que os participantes deveriam arrancar com um só golpe o pato que era amarrado a um poste, sob pena de desembolsarem o valor do bicho em dinheiro.

A pobre da jabuticaba só demonstrava qualidades até virar sinônimo das excrescências que só acontecem por aqui. A comparação, no princípio uma homenagem à fruta – se é do Brasil, mas não é jabuticaba, não presta -, perdeu seu sentido com o excesso do uso em companhias de má índole.

(Parêntese: jabuticaba não é exclusividade brasileira. Embora tenha surgido nestas bandas, é cultivada na Argentina, no Uruguai e existem registros de dois pés no Jardim Botânico de Londres).

Voltando à jabuticaba. Se tivéssemos propensão à autoestima, ela bem podia ser um exemplo das nossas virtudes: tem design criativo (cresce no tronco e nos galhos), alta produtividade (duas safras ao ano), vida longa e gera frutos mais saborosos com o passar dos anos.

Mas como somos mais acostumados a reconhecer e ressaltar os defeitos que nos cercam, coube à jabuticaba pagar o pato (ops!).

Acadêmico: Simone Gehrke

 

Gênero: Crônica

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