Ac. Walter Guerreiro leu “A culpa está morta”, de Alcides Buss

 

MEA CULPA, Poeta

 

Não tem culpa o poeta, se o leitor julgando-se togado, emite seu parecer. Longe de eu mesmo pretender, nos campos alísios da literatura ir à trova, ápice do pensamento e da linguagem como construção artística da alma.

Tudo aflora ao ler e reler “A culpa está morta e outros poemas” de Alcides Buss, e, aviso aos navegantes (para aqueles que se recordam de “A voz do Brasil”, o mais antigo programa radiofônico de difusão de acontecimentos nacionais na América do Sul): poesia não é minha praia! Afirmação estranha para alguém que, durante toda a vida se derrumbou sobre os livros na paixão voraz da leitura, ferramenta de trabalho ou dos momentos de ócio, fato é que para mim, toda e qualquer forma de escrita exige forma e conteúdo, no caso explícito da poesia indo além da mensagem, transmitir emoção.

O que aparenta ser simples não é, a forma pode ser aberta ou não quanto à rima, uma vez que as exigências parnasianas de há muito caíram por terra, contudo, mesmo aberta tem de ter ritmo. Quanto ao conteúdo não me agrada o adocicado como soe acontecer nos delíquios adolescentes, essa talvez seja, entre outros o motivo pelo qual me inclino aos Haicai, sucintos, em três linhas transmitindo a mensagem, ou não, uma vez que o satori é individual, naquele momento essencial do corte, o kiru, entre o devaneio poético e a realidade , que faz o poeta e nós outros criar a conexão com a realidade.

Entretanto, esse livro do confrade Alcides Buss, me despertou em algumas poesias o que sinto na japonesa, já não digo nas “Escritas do mar”, com o belo insight do barco remendando o mar, indo de Camões a Deleuze no vir-a-ser como conteúdo do próprio desejo, simultaneamente ponto de partida e de chegada, em um estado quântico de tudo que não é. “As árvores e eu” bem poderia ser aquele wabi-sabi escorregadio da perfeição, do inefável sentimento de vê-las nas próprias ruínas da autoestima, percepção fugaz da verdade no kiregi, o momento do corte, como emoção sentida na impermanência do instante.

Isso é poesia, uma espécie em extinção, aqui em seu pleno domínio.

Walter  de Queiroz Guerreiro

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