Anota o meu pedido aí!

O advogado era novo, de experiência, mas já contava as quatro décadas de vida. A ausência de prática forense era compensada pela vivência de um longo casamento e dois filhos já bastante crescidos, aliada à duas décadas de trabalho em grandes empresas da cidade.

A juíza trabalhista também tinha certeza experiência, bem como beleza e traquejo que lhe garantiam competência e postura dignas de uma verdadeira dama.

E assim quis o destino que se encontrassem naquela fatídica quarta-feira, um dia de sol forte de verão, à época das antigas Juntas de Conciliação e Arbitragem, com juízes classistas por toda a parte, tentando fazer um acordo antes da chamada das partes ao ato.

Nada conciliado, adentraram à sala da dita juíza, além das partes, os advogados e o juiz classista informando que não houvera acordo. Iriam instruir o feito.

Apregoadas as partes, passou-se ao depoimento pessoal do reclamante, sendo dispensado o depoimento do representante da reclamada. Logo na primeira testemunha daquele, o advogado faz uma pergunta que a juíza mal deixara-lhe chegar à última sílaba:

– Indeferido, doutor.

– A doutora pode consignar em ata? – prontamente retruca o advogado.

– Sim, depois, no final, eu anoto…

E assim sucederam-se outras perguntas, outras testemunhas, até que não havendo mais provas, foi encerrada a ata.

– Pela ordem, Excelência – questiona o advogado.

– Sim…

– A doutora não constou o meu pedido do indeferimento daquela pergunta…

– Que pergunta? – vê-se surpresa a juíza.

– Aquela que a doutora falou que iria constar no final. Preciso que conste na ata, Excelência – rebate o advogado.

– Não, doutor, não vou constar porque o doutor deveria ter dito naquela hora. Agora já precluiu…

E começa o bate-boca entre advogado e juíza, sem ambos “baixar a guarda”. Entre anotar o requerimento do advogado e não anotar na ata, a juíza sentenciou – utilizando-se figuradamente a linguagem:

– Não vou constar, doutor. A ata é essa e é essa que vai ser assinada – e prontamente apontou sua assinatura no documento e repassou-o ao advogado da reclamada, para encerrar (ou tentar) o assunto.

O documento rodou a mesa e até mesmo o reclamante assinou. A juíza já analisando o caso da próxima audiência, concentrada, levanta a cabeça e vê que a ata ainda não foi assinada e consta com o advogado, que está escrevendo algumas coisas… na ata!

– Doutor, o senhor não pode escrever na ata! – brada ao advogado.

– Ah, posso sim, doutora! Se a senhora não quer colocar, eu mesmo coloco! – e continuou a escrever em ata a pergunta indeferida outrora pela digna juíza.

Novo bate-boca que em nada alterou os fatos e resultou em ofício à OAB e à Corregedoria da Justiça do Trabalho. Ambos foram punidos, objetivamente e subjetivamente.

O advogado recebeu multa de meio salário mínimo por alterar a ata de audiências e a juíza foi advertida por não constar em ata pergunta indeferida por ela.

Nunca mais o patrono escreveu nada na ata que não fosse sua assinatura.

18/4/2016

COMPARTILHE: