Cale-se! (Simone)
Cale-se!
Peço desculpas ao leitor pelo tom imperativo da abordagem: títulos precisam ser curtos, diretos e incisivos. Minha intenção não era dar uma ordem, como faz parecer à primeira vista; queria, apenas, propor uma postura diferente do padrão, caso alguém estivesse interessado em adotá-la.
Sei, porém, que mudanças de hábito são pouco prováveis. Fazemos parte de uma sociedade acostumada a excessos, que de um modo geral prefere a quantidade à qualidade naquilo que consome e produz.
Verbalizamos e digitamos, a todo instante, um volume de informação muito superior ao que nossos possíveis receptores seriam capazes de absorver, sem contar que demonstramos cada vez menos interesse e disposição em lidar com os dados produzidos pelos outros.
Falamos demais e calamos de menos. Temos opinião sobre tudo e refletimos sobre quase nada. Compartilhamos muito, desde o advento das redes sociais, e absorvemos pouco, nesses canais que surgiram com a promessa democrática de multiplicar nossa voz e nossas ideias ao redor do mundo.
Valorizamos o direito à liberdade de expressão, em detrimento da faculdade de cultivar o silêncio. Perdemos a noção de que a comunicação só se completa quando existe pelo menos um destinatário disposto a recebê-la.
Sentimos uma necessidade incontrolável de expor nossos pontos de vista a respeito de tudo e de todos. Somos mais de 7 bilhões de emissores, querendo descobrir onde está Wally, o escondido e desejado interlocutor.
É por isso que aposto no oposto. Os especialistas já não disseram que vivemos na economia da atenção? Como ensinam os fundamentos desta ciência, o bem mais valorizado e disputado é sempre o mais raro, pouco disponível.
Portanto, se todos falam, cale-se!
Já pensou na oportunidade de atrair a curiosidade alheia ao agir de forma diferente? Não é uma novidade, basta retomar um aprendizado que os antigos conheciam antes da supervalorização do discurso e da exposição pública: se a palavra vale prata, o silêncio vale ouro.
Reduzir a fala oferece outros benefícios.
Calados, economizamos energia, nossa e de terceiros, que pode ser empregada em atividades mais produtivas.
Quietos, colaboramos para reduzir a poluição sonora, melhorando a qualidade do ambiente agitado em que estamos inseridos; Adotando o silêncio, voltamos a valorizar o sentido e o poder das palavras, especialmente as próprias.
Diminuindo o uso da fala, abrimos espaço para perceber os contextos que nos cercam com o desenvolvimento dos outros sentidos.
Evitando pronunciar palavras que se esvaem tão logo acabam de ser pronunciadas, ampliamos nosso poder de escuta, para ouvir os outros e refletir sobre nossas angústias e certezas.
O exercício pode começar devagar, quem sabe aproveitando parte do feriadão desta semana. Se não tiver algo importante a dizer, cale-se!
Simone Gehrke