Escola do Mar (Zabot)

 

ESCOLA DO MAR

Eis que Barra Velha implantou o projeto:  Escola do Mar. E no contra turno escolar. Nada mais oportuno, certamente. Barra Velha tem tudo a ver com o mar. Até o nome do município associa-se ao grande oceano Atlântico. Ali, as águas aparentemente calmas do rio Itapocú só sossegam quando encontram o mar. E a força do mar – empurrado pela corrente marinha Sul (fria), conhecida como Falklands -, desloca a barra rumo ao norte. Jogo de forças descomunais. Luta de Titãs. O fenômeno se repete em toda a costa sul, pois a as barras – quando não protegidas por costões -, movem-se no sentido norte.

A barra velha – antiga foz do rio Itapocú –, segundo os oceanólogos situava-se em outros tempos onde hoje se encontra a Colônia de Pescadores. Colônia Z-4 SC. Ali, um refúgio encantonado – formação de rochas seculares -, abriga as embarcações nas intempéries marinhas. Mais ao sul, na foz do rio Itajuba –, conhecida como barrinha, também abriga barcos.

Mais distante da costa, outra é a influência: corrente tropical proveniente do Norte, originária na costa africana banha a maior parte do litoral brasileiro.

Santa Catarina, em termos de costa marinha, é privilegiada. Ao todo são 531 km de costa Atlântica. Sete por cento da brasileira.

A colonização das terras catarinenses muito deve ao mar. O Porto de Itajaí, porta de entrada; o Porto de São Francisco do Sul, também. Imbituba, ao sul, e por aí afora.

O mar que antes servia à navegação, torna-se celeiro. Pescados. De caça às baleias, famosas armações.  E reserva de sal. E, torno desse rico santuário projeta-se toda uma infraestrutura: fabricação e recuperação de embarcações. Confecções de redes e apetrechos de Pesca. Salgas. Cabotagem. E, especialmente a gastronomia típica: apreciados frutos do mar.  Em outras palavras – nesse affaire, continente e mar -, de forma incólume interagem – unindo o útil ao agradável.

Do mar originaram-se as primeiras as acumulações de capital – as fortunas -, ou por ele circularam e circulam. E intensificam-se as atividades, algumas conflitantes. Não há, portanto, como dissocia-lo dos ciclos de desenvolvimento a começar com o pau-brasil, e hoje, com as comodities do agro em franca expansão.

E, gradativamente, amplia-se o ecossistema costeiro:  ambiente de lazer, pescarias e turismo náutico. E, sobretudo, espaço de sociabilidade.  Convívio. Brasileiros de todos os quadrantes, vez por outra confraternizam à beira mar, especialmente no réveillon. Curiosidade imobiliária:  compra-se moradia em saca de soja. Moeda agrícola, portanto.

A ocupação desenfreada acendeu, todavia, um sinal de alerta. O projeto de Gerenciamento Costeiro, em boa hora, buscou e busca disciplinar o processo de urbanização. O governador Luiz Henrique, com propriedade, denominou esse processo de litoralização.

Mas o mar também inspirava e inspira cautelas. “Andar no mar, andar a enterrar”, palavras de Franklin Cascaes, mago das bruxas. Dai o faro dos navegadores e dos pescadores: leitura dos sinais da natureza. E, face disso, ao acessá-lo – prevenidos -, tomavam as devidas providências.

Raul Brandão, na obra Os Pescadores – obra prima sobre o tema –, elenca esses riscos presentes na foz do Rio Tejo, especialmente antes da entrada das embarcações a motor. Tragédias e mais tragédias repetindo-se.

É evidente que os tempos mudaram tanto para navegadores, quanto para banhistas. Informações meteorológicas de alta precisão alertam em tempo hábil sobre riscos. E, sobretudo, informam os momentos adequados para navegar ou frequentar as praias.

Uma realidade, porém, chama a atenção. Grande parte da população que habita ambientes costeiros, especialmente as novas gerações pouco conhecem da história – fatos e feitos – ocorridos. Vivem o momento, apenas.

Diante deste cenário, em Bombinhas surgiu um projeto ousado: envolver os jovens escolares das últimas séries do ensino fundamental em estudos e vivências marinhas. Ela é rica e diversa, não apenas nos museus existentes no litoral, mas, sobretudo, pela presença de velhos mestres, remanescentes de construtores de embarcações. Artesões natos. E das descascadoras de camarão.

A cultura marinha salta aos olhos, portanto. Desfrutá-la, um senhor desafio. E para isso nada melhor do que envolver a juventude. Em suas mãos, com certeza, repousa o presente e o futuro. Ao conhecerem o dia a dia dos pescadores e das pescadoras seu proseado, hábitos e costumes, alguns seculares passados de pai para filho – estes jovens passam a ser multiplicadores desse rico tesouro. Guias privilegiados a serviço de uma boa causa. Enlace perfeito, portanto.

As primeiras turmas já apresentam resultados. Surpreendem, tanto em Bombinhas como em Barra Velha. E olha que grata surpresa, sem desprender muito esforço, pois parcerias potencializam ações.  Prefeituras municipais através das secretárias de Educação, Turismo e Pesca, Epagri, Colônia de Pescadores, Universidades e Museus. E mais: CEPSUL e Marinha, Polícia militar e Corpo de Bombeiros.

E, sobretudo, a presença de artesãos: rendeiras, redeiros, concheiros, talhadores em madeira: plêiade exponencial interagindo, cada qual contribuindo à sua maneira. Entusiasmo e alegria sobram nessa boa gente. Maravilha de iniciativa.

Virgílio Várzeas notável escritor catarinense na obra Mares e Campos já prenunciará esse rico tesouro descrevendo-o de forma primorosa. O livro: um clássico.  O pescador associa mar e campo.  Água e terra. Anfíbios, segundo Cascaes.

Eis, portanto, uma iniciativa digna de aplausos – as escolas do mar.  Santa Catarina, mais uma vez dá exemplo de ousadia.  Ou por outra: sai na frente.

A todos os protagonistas, pelo achado parabéns! E essa juventude, com certeza, fará toda a diferença.  Alvissaras!

 

Joinville, 25 de novembro de 2022

Onévio Zabot

Engenheiro Agrônomo

 

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