Lobateando (Else)
Lobateando
Else Sant’Anna Brum
A tarde estava ensolarada e a mesa de ping-pong na varanda de casa convidava para umas boas raquetadas, mas as gêmeas Bruna e Vanessa não podiam nem pensar nisso. Estavam esperando a Suzi e a Amanda para um trabalho escolar. Ficaram sentadas na varanda da casa e viram as duas chegarem rindo e brincando.
– Por que vocês estão tão sérias? perguntou Suzi.
– Claro, né? Estamos quebrando a cabeça para achar idéias para o nosso trabalho.
– Que nada, falou Amanda, nós já pensamos sabe em quem? Monteiro Lobato. Sendo sobre livros e leitura não tem ninguém melhor. Temos toda a coleção dele, lemos e relemos seus livros e vocês também. Cada uma escolhe um livro e o pedaço que mais gostou do livro. Concordam?
– Sim, disse Bruna. Escolho Reinações de Narizinho.
– Eu também, falou Vanessa, e já vou logo dizendo o meu pedaço que é quando a turminha do Sítio usa a linguagem do “P” na aventura do país dos macacos.
– “Apavipisepe Pepenipinhapa quepe espestapamospos naspas upunhaspas despestapa hoporrenpendapa mapacapacapadapa.” (Avise Peninha que estamos nas unhas desta horrenda macacada).
– Ópotipimopo! disse Amanda. Eu também escolho Reinações de Narizinho, com a descrição do vestido de casamento dela com o Príncipe Escamado feito por Dona Aranha: “O mais lindo era que o vestido não parava um só instante. Não parava de faiscar e brilhar e piscar e furtar-cor, porque os peixinhos não paravam de nadar nele, descrevendo as mais caprichosas curvas por entre as algas boiantes. As algas ondeavam as suas cabeleiras verdes e os peixinhos brincavam de rodear os fios ondulantes sem nunca tocá-los nem com a pontinha do rabo. De modo que tudo aquilo virava e mexia e subia e descia e corria e fugia e nadava e boiava e pulava e dançava que não tinha fim.”
– Vejam, comentou Suzi, como Lobato trabalha a linguagem com arte! A parte que eu escolho se refere ainda ao maravilhoso vestido de Narizinho. Emília, muito curiosa, mantém este diálogo com Dona Aranha, a costureira:
“- Quem é que fabrica esta fazenda?
– Este tecido é feito pela Fada Miragem.
– E com que a senhora o corta?
– Com a tesoura da imaginação.
– E com que agulha o cose?
– Com a agulha da fantasia.
– E com que linha?
– Com a linha do sonho.”
– Eu prefiro uma parte engraçada, disse Bruna. O pedaço em que Emília fica brava porque Tia Nastácia não acredita que ela está falando:
“- Mangando o seu nariz! – gritou Emília furiosa. Falo, sim, e hei de falar. Eu não falava porque era muda, mas o Doutor Cara-de-Coruja me deu uma bolinha de barriga de sapo e eu engoli e fiquei falando e hei de falar a vida inteira, sabe?”
As meninas completaram o trabalho com a biografia de Monteiro Lobato, dando-lhe o título de “Lobateando”. A apresentação do trabalho foi muito apreciada, recebendo elogios da professora. Mas o que não se pode deixar de contar é que naquela tarde, depois de um lanche gostoso oferecido pela mãe das gêmeas, as meninas correram para as raquetes,pois a bolinha estava lá na mesa esperando por elas.