O menino que descobriu Joinville (Salustiano Souza)

 

O MENINO QUE DESCOBRIU JOINVILLE

Salustiano Souza

 

O menino desabrochava em mim. Inquiridor nas buscas, embevecido nas descobertas. A cidade abria-se nos mistérios de seus recônditos, ofertando mesclados de tintas e cores por todos os lados, como se porejassem no percurso de suas ruas.

Tudo era novo e velho ao mesmo tempo. Maravilhado, gostava de observar a azáfama do cais do Mercado Público. Caixas de peixes subiam nas costas de homens atarracados, gritarias nas barcas e canoas que sacolejavam ao sabor do rio. Nas lojas do mercado, barricas e tablados ofertavam pimentas vermelhas, frutas exóticas e especiarias, cujo cheiro misturava-se ao odor dos peixes, chegando a dar comichão no nariz.

Era gostoso tomar banho no Rio Cachoeira, deixando as roupas embaixo do pé de figueira que ficava na subida da casa do Fritz Alt. Atravessávamos o rio a nado e víamos as barcas que ancoravam no Moinho para carregarem sacos de trigo.

A pé ou de bicicleta, adorava esquadrinhar o centro, a pracinha da Rua do Príncipe, o relógio da Igreja da Paz, o posto de gasolina do Hoepcke, a rodoviária que virou prefeitura. Seguia maravilhado, vendo o movimento dos carros, os homens apressados de chapéu, as mulheres com seus vestidos compridos e xales de renda.

Mas a maior descoberta era sempre a Biblioteca Pública. As arvores majestosas protegendo o prédio, como se fosse um castelo repleto de tesouros, os livros antigos encadernados em marrom, o cheiro de coisa antiga, tudo aquilo me fascinava. No silêncio austero ficava contemplando os livros, tentando imaginar as aventuras que eles escondiam.

Não sou nascido em Joinville, mas aqui fui fecundado pela leitura e escrita.

Gratidão.

Salustiano Souza

 

Março/2024

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