Queijo danado de bom (Zabot)

QUEIJO DANADO DE BOM

Ora, queijo… Quem dispensa um bom queijo?  Tantos são os queijos; haja degustação! Que o diga os camundongos.

Dia desses surpreendo colegas da Academia Joinvilense de Letras… À mão, uma peça de queijo lá de Pirabeiraba. Do mestre Gil. De cara, salivaram, não antes sem a devida anuência do renomado médico mineiro, doutor Fiuza. Da terra dos queijos, ao saboreá-lo, tasca: – Conversa fiada, gente!

– Este queijo não é daqui, não; é lá das Gerais. Como mineiro que é, e entende de queijo; calo-me. Riso entre os dentes.

– Vejam a embalagem, aponto. Em letras garrafais lá estampado:

– Queijo Colonial – Lacticínio Joinville. Gargalhada geral.

O doutor Adauto, emérito manenzinho embarca:

– Sabem como se faz para um mineiro se “virar nos trinta’… Nem espera respostas.

– É só rodar um queijo ladeira abaixo.  Ao encalço, descabela-se todo. Dona Ilse, secretária, se apaixona pelo queijo.  Encomenda meia dúzia.

Cá entre nós: onde há uma tábua de queijo e uma taça de vinho, sempre rolam amizades. Namoricos.  E com polenta assada na chapa, então… Saí de baixo.

Criei-me entremeado de queijos. Sorte minha. Casarão colonial, casa dos avós paternos. Fazê-los: uma técnica, mais que isso: uma arte. Arte de mulher queijeira. Paciência, muita paciência desde a ordenha, ao coalho, até maturação. Quanto mais curado, mais saboroso. Prateleira repleta lá no porão, símbolo de fartura.

Da convivência com queijos padronizados, miúdos, a surpresa em Santana do Livramento RS… Queijos de todos os tamanhos por lá, empilhados na porta das bodegas. Os maiores – tamanho pneu de patrola -, na base da pilha; os menores – verdadeiras iscas -, no topo. Coisa de mais de metro de altura. Maestria uruguaia, onde se produzem alguns dos melhores queijos do mundo. Mais tarde, circulando em Rosário, a realidade:  pastagens esplendorosas. Gramíneas e trevos consorciados. Matrizes mimadas. Planícies a perder vista.

Conta-se entre os árabes que o queijo foi descoberto por acaso. Alguém portava leite de cabras. Prevenção de viajante.   Água para matar a sede, diz a lenda.  Eis, no entanto, que com o calor o leite azedou, coalhando. Verdade ou não, o queijo nunca deixou de ser uma maneira de dar sobrevida ao leite.

Lendas à parte, consolidaram-se as queijarias, especialmente no velho continente.  Primeiro com a ordenha de ovelhas depois de cabras e vacas. O de água, ressalte-se:  é famoso na Mongólia. Columella, escritor Romano, em 65 da Era Cristã, descreve detalhes de como fazia-se queijo Império Romano. Dá Europa, com as grandes navegações, galgou outros continentes. Na França, tradicional produtora, conta-se que certa feita Charles De Gaulle, não se contendo exclama:

– “Como governar um país que tem 246 tipos de queijos diferentes”.

Certa feita em Goiás, a surpresa.  Nas fazendas, cada visitante recebia um garfo alongado para espetar um naco de queijo e leva-lo à brasa.  Inconfundível sabor goiano.

Santa Catarina, estado rico em etnias, porta um mosaico queijeiro invejável. Italianos, alemães, suíços, poloneses, russos e por aí afora. Não poderia ser mais apropriado.

Porém, em face da legislação sanitária extremamente rigorosa queijos tradicionais, os famosos coloniais, foram gradativamente sendo relegados. Risco à saúde, a alegação.  Sem pasteurização, nada feito. Sobrou para o tradicional queijo serrano, e tantos outros, como kochkaäse e o schafar cäse, queijo forte.

Mas, eis que após longa discussão, finalmente vem o reconhecimento. Indicação geográfica. Valorização da cultura local.

Desde que o plantel esteja livre de doenças infeciosas transmissíveis sem problema.   Exames sanitários em dia, incluindo os manipulares, e observadas boas práticas de fabricação, tudo certo. E instalações apropriadas, aprovadas pela vigilância sanitária, obviamente.

Com isso não só se resgatam tradições, mas, sobretudo, preservam-se e se promovem valores da gastronomia tradicional. Gastronomia milenar. É Jogo do ganha-ganha-ganha. Ótimo para produtor, melhor ainda para o consumidor e para a indústria turística – joia da coroa.

Esperamos que, em breve, o queijo serrano e os queijos coloniais estejam nas gôndolas dos supermercados, das mercearias e das panificadoras de onde nunca deveria ter saído. Alvissaras! Novos tempos à vista.

 

Joinville, 5 de setembro de 2020

 

Onévio Zabot

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