📚David (Marinaldo)
TEXTO PRESENTE PARA DAVID GONÇALVES
“Eu sempre optei por uma linguagem simples, objetiva, sem devaneios linguísticos e desestruturação da forma. Faço isto como opção. Nunca pretendi escrever difícil.”
‘ Era uma vez, um lugar chamado Quadrínculo – cidade escrita para ser descrita como aquela onde tudo pode acontecer. Lá, tinha um homem muito inteligente, crescido de um menino muito esperto que dizia que quando crescesse seria muito inteligente, e assim foi. Dado a ser tanta coisa que um escritor pode ser, ele assim tornou-se. Gente grande, começou a fazer coisas grandiosas. Deu entrevista, virou entrevista, escreveu cartas, fez filhos e netos, olhou para o campo, olhou para a terra, a vermelha terra de Quadrínculo, e nela viu sangue, tanto no vermelho basalto de seu carbono quando no verde do sangue de sua vegetação. Daí, escreveu Sangue Verde e Pés Vermelhos. Gente grande tornada, David Gonçalves tornou-se um escritor, desses que mesmo quem não gosta valoriza o respeito. De posse de ferramentas pesadas: palavras, geografia, maestria, preocupação social, poesia marginal e muita filosofia – essa sempre presente, mesmo enquanto escondida, em algum discurso saltando do olho de seus personagens – o autor (alcunha muito mais valiosa para quem destrincha um enredo e dá vida a tudo e mais tudo que existe) passou a escrever histórias extraordinárias. À sombra de um lampião ou ao Sol dos Trópicos de alguma elegia carregada, de forma santa e concreta, de uma alegria imensa por estar vivo, ele escreveu tópicos pertinentes, utópicos continentes, apócrifas lições na boca de seus beatos, além de adeptos sentimentos e relapsas dimensões … (Opa… (pausa) Acho que tenho que voltar-me para a linguagem que busco encontrar neste presente. Dar ao presenteado David o que ele mais brada, a simplicidade linear que atinge a todos e comunica mesmo a quem não sabe ler) Preocupado com quem lê, o menino que adotou Quadrínculo como o mundo onde tudo poderia se resolver, com seu olhar filantrópico sobre o humano, trouxe para nós tantos nós, tantos lanços, e desalinhou as pences para alargar os cós e assim, vestirmos melhor a roupa humana em que melhor nos apresentamos. David, como um rei, fez digressão, progressão, fez cada personagem seu continuar depois da vírgula e permanecer depois do ponto final. A gente lê duas a quatro linhas de algum de seus contos e já se expande numa extensão de alguma ideia que, como uma locomotiva, nos leva por uma narrativa descritiva, emotiva e comovente. Referenciado, já disseram que “sua obra, refugiada em uma aparência simples e despretensiosa, à medida que a fruímos, vai-nos revelando uma narrativa profunda, consistente, carregada de denúncias e de procedências; descortina-se, pois a obra densa que se mostra denunciadora.” Eu li e fiquei emocionado. Honrado por fazer parte de uma Academia com tanta gente condecorada, respeitada, vívida, que poderia, e deveria ser imitada. Em determinado conto David diz que algo roi dentro do peito. Às vezes também algo dói. Mas basta ler um pouco mais para entender que essa dor é feita de olhar. E esse olhar, de amar o corpo do seu chão. E sendo assim, nessa força de se enfiar nas histórias que escreveu, vamos percebendo que a dor, se fruto do amor, é sinal de que a maior parte, valeu…
Assim. Simples e desmetaforizado.
Marinaldo de Silva e Silva