A boa cana (Zabot)
A BOA CANA
Dia desses no interior de Joinville – mais precisamente em Pirabeiraba -, um grupo remanescente de produtores de cana-de-açúcar confabulavam. Papo animado, especialmente após um apreciado aperitivo. Isso, no entanto, só no final do encontro, pois o mesmo tem carácter técnico: troca de experiências. O grupo formado em razão de problemas, o mais premente: controlar a praga da cigarrinha nos canaviais. A cigarrinha, um inseto sugador, ataca várias culturas: milho e arroz, preferencialmente. Mas também pastagens. Espuma para proteger a larva, marca registrada. De difícil controle, um senhor desafio. Outro objetivo do encontro: introdução de novos cultivares. E manejo. Boas práticas agrícolas. Adubação verde, por exemplo.
Determinado, o grupo coordenado pela Epagri e Secretaria Municipal da Agricultura e Meio Ambiente, antiga Fundação 25 de julho, traçou algumas metas: 1) intercâmbio técnico com outras regiões produtoras; 2) capacitação e 3) introdução de novos cultivares.
Viagem ao litoral paranaense, Morretes mais precisamente, resultou na primeira troca de informações e experiências. Isso em setembro de 2018. Ali a Universidade Federal do Paraná desenvolve ensaio de cultivares. A UFPR faz parte Rede de Pesquisa de Universidades Federais (RIDESA). Ao todo há 114 variedades de cana cultivadas no país, das quais 70 aprovadas pela pesquisa para cultivo. Ressalte-se, no entanto: duas variedades são as mais cultivadas: a RB867515 foi desenvolvida pela Universidade Federal de Viçosa, e a outra, a RB966928, pela UFPR. Em média o tempo para lançar uma nova variedade é de 12 anos, podendo chegar a 18 anos em alguns casos. Importante: os recursos são provenientes da iniciativa privada, das 298 Usinas conveniadas no projeto. Sem dúvida, um exemplo de parceria. Jogo do tipo ganha-ganha.
Portanto, se o Brasil é hoje, de longe, o maior produtor mundial de cana-de-açúcar – leia-se com isso também de derivados: açúcar, etanol, cachaça, melado, garapa e uma infinidade de outros itens -, devemos a essa rede potencializadora.
E Santa Catarina também faz parte dessa trajetória. A primeira Usina do Duque D’Aumale – irmão do Príncipe de Joinville -, marcou época. Estrutura moderna, então. Equipamentos importados da França. Duque D’Aumale era empreendedor e cientista, membro da Academia de Ciências da França. Parte da estrutura da velha usina ainda se encontra preservada na Estrada do Curto, Pirabeiraba. Monumento vivo da colonização. Não é de graça que um feixe de cana faz parte do brasão da cidade dos príncipes. E de outro, o arroz, ambos ícones históricos.
As reuniões do grupo ocorrem em rodízio. Cada bimestre, numa propriedade. Depois de um bom café, via de regra, ocorre abordagens de cunho técnico. E, em seguida, visita à lavoura e, se for o caso, a unidade de processamento de derivados.
O grupo compõe-se de produtores de melado e mousse, cachaça, licores e também e de garapeiros. Nesse caso entregam varas devidamente beneficiadas. Sempre em feixes. Capricho de canavieiro, não apenas, pois visa atender requisitos da vigilância sanitária. Precaução, portanto.
Na última reunião – propriedade da família Hardt -, cultivares ali plantados foram avaliados. Dois deles revelaram-se promissores. No entanto, nenhum superou a performance da havaiana – tradicional da região. A mesma atende todos os quesitos em termos de produtividade e qualidade. E grau BRIX: teor de sacarose. Boa na roça, e mais ainda de açúcar, portanto. Abílio, tradicional produtor da estrada Palmeiras é vidrado na cultivar. – Insuperável, pondera.
Fato hilário: Gilberto que apresentava os ensaios, subitamente detém-se diante de uma parcela. – Vejam, informa: aqui está a cultivar preferida do cavalo. Solto, experimentou todas, mas escolheu esta. Macia e palatável. Esperto o cavalo de Gilberto. Gargalhada geral. Recomendável, neste quesito, como forrageira.
Excursão a Massaranduba e Luiz Alves está no radar do grupo. Deve ocorrer proximamente. Meados de agosto. Cá entre nós, ótima escolha, afinal Luiz Alves é a Capital Catarinense da Cachaça. Pinga buena. Ah, em tempo: a próxima reunião será na propriedade da família Vetterlein, estrada do Oeste. Dacir, ousado empreendedor, apresentará estrutura devidamente projetada para produção compostagem. Biofábrica voltada para o aproveitamento do bagaço da cana. Nessa época de crise de fertilizante, certamente uma cartada de mestre.
Antes da partida, porém, a surpresa: um licor curtido em banana passa, gentileza do patriarca Hardt. Elixir dos deuses. Delícia. De faceiros, alguns estalavam a língua. Recomendamos.
Joinville, 9 de julho de 2022.
Onévio Zabot
Engenheiro Agrônomo