A noite antes do Natal (Simone Nascimento)

 

A noite antes do Natal

Simone Nascimento

 

Era o Natal de 1975, na sala havia o presépio de barro com todos os personagens bíblicos, tínhamos a manjedoura e nela encontrávamos Maria, José e o menino Jesus. Havia, ainda, os três reis magos e os animais, bois, ovelhas e o burro. No alto da manjedoura a estrela brilhante; a casa estava enfeitada, as luzes piscavam e iluminavam o ambiente trazendo o ar natalino. Na vitrola uma canção de Natal tocava.

O clima de Natal estava por toda parte, minhas irmãs Rosália e Adriana, de cabelos e olhos castanhos, vestidos de flores, estavam serelepes como nunca e ansiavam pela sua chegada.; eu também ansiava, ainda que não acreditássemos mais em Papai Noel. Nós três nos sentamos ao lado de nossos pais na sala e minhas irmãs ficavam a indagar se iriam ganhar presentes.  Imaginávamos que sim, mas sempre restava uma dúvida. Eu tinha apenas dez anos de idade, e nossa mãe, dona Nelci, dizia que o Natal é o nascimento do menino Jesus; é tempo de boas novas, retrucava ainda, dizendo “se você e suas irmãs foram boas crianças certamente o Papai Noel trará um presentinho”. No relógio os ponteiros passavam das vinte e duas horas e era o momento das crianças arrumarem suas camas para dormir. Mas o sono não vinha e a imaginação corria fértil. No telhado da casa um pequeno barulho. Olhos arregalados, fez-se um silêncio por breves minutos. Cochichávamos no quarto e nossa vontade era andar pela casa e procurar no quarto de nossos pais ou no forro da casa pelos presentes que acreditávamos estar escondidos. Não podíamos fazer barulho, e assim acabamos por adormecer.

Somos três irmãos, e cada um de nós com sonhos por presentes distintos, Rosália ansiava por uma boneca, Adriana por panelinhas e fogão e eu por uma bicicleta diferente. Teríamos sido de fato boas crianças durante o ano? Com boas notas na escola? Será que fomos obedientes?

Ora, onde vivíamos a cultura que se perpetuava era que se as crianças tivessem sido boazinhas durante todo o ano ganhariam presentes de Natal; e caso tivessem sido malcriadas e com notas ruins na escola não teriam direito aos presentes. O dia amanheceu, era 25 de dezembro de 1975, dia do nascimento do Menino Jesus. Nós três levantamos e corremos para a sala. A alegria era imensa: ao lado da árvore de Natal estavam os presentes.

Começamos a abrir os pacotes, dona Nelci apontava, “minhas filhas seus presentes estão ali”. Rosália abre o primeiro pacote e encontra a esperada boneca, de cabelos encaracolados, pernas bonitas e sapatinhos brilhantes. Adriana também abre o pacote e encontra panelinhas, pratos, fogão, uma verdadeira minicozinha para brincar. Meu filho, exclamou dona Nelci, seu presente é aquele ali. Quando vi o tamanho do pacote, tentando não demonstrar, entristeci; eu o abri e não pude acreditar: meu presente era uma blusa azul e um short de verão.

Meu pai em pé na sala estava a me observar! Eu não podia mostrar a minha decepção em não encontrar o sonhado presente, o presente que um menino de dez anos espera. Naquele tempo a vida era mais difícil e os filhos não ganhavam tantos presentes como hoje em dia.

Nossa mãe avisou: “Filhos, o café da manhã está na mesa, preparei deliciosas rabanadas (fatias douradas) para esta manhã de Natal”. Todos fomos para a mesa. Minhas irmãs não cabiam em si de tanta alegria. Porém meu coração de menino estava apertado. Então minha mãe perguntou: “Luizinho você já terminou seu café?” Sim, respondi; e ela continuou, “acho que você esqueceu de olhar no outro canto do sofá”. Levantei rapidamente na companhia de minhas irmãs e corri para a sala, eu não podia acreditar, rasguei aquele imenso pacote e lá estava ela, a minha Tigrão; uma Monark na cor ferrugem brilhante, com o banco preto, bem comprido, o guidão alto; os freios eram nas mãos, uma novidade na época. Meu peito explodia de tanta felicidade.

Quarenta e sete anos depois, ainda recordo daquele Natal!

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