A senha (Adauto)

A SENHA

É a senha……, disse o sargento encarregado do grampo, em plena ditadura. Seu amigo e colega já fora delatado e sequestrado. Como é?

A Vó morreu. Enterro em Campo Alegre.

Vamos faturar. Este que acabo de ouvir é o oitavo. Deve haver reunião lá, porque aquele advogado, que parece ser o líder já sumiu no fusca. Bem algemado e oculto… Na Vossóroca damos um jeito nele. Agora vocês vão a Campo Alegre. Fazer o flagra. Fiquem na estrada e vão anotando os veículos. Alguns devem ir juntos. Será fácil identificar, disse o tenente.

Era do CPOR, mas para se promover, passou a agir como delegado da ditadura na Operação Araucária. Queria se promover, a prender subversivos além da área dela. Já fizera umas pesquisas sobre o advogado. Agora, apareciam outros. Uma tarrafada só sobre uns dez. Ia ganhar medalha. Ser promovido a 1º. Tenente. Nem precisaria mais do diploma universitário para trabalhar. Acabaria a faculdade só por segurança. A ditadura poderia não durar. Tinha só três anos e pouco….

– Vamos pegar um caminhão no batalhão. Explicarei ao Comandante parque…

O Comandante ouviu as explicações, chamou o ordenança e mandou liberar um caminhão.

Os beleguins, esfregando as mão receberam o veículo e um deles assumiu a direção. Era chofer. Traçaram o rumo. Direto para a Br. Passaram no centro da cidade. Ganhariam tempo e não seriam notados. No km. 21 da Serra estacionaram esperando o movimento de veículos. Passou só um ônibus da linha. Mandaram parar para o revistar. Só havia colonos e operários, mais algumas senhoras sem caras de subversivas. Seguiram….E chegaram….

Ficaram até começar o entardecer. Não passou mais ninguém suspeito. Uns a cavalo; outros de bicicleta e um de motocicleta.

– Vamos a Campo Alegre. Já podem estar reunidos. Subiram por outra estrada –tentou justificar o tenente. Temos de pegá-los no flagra. Quando iam entrando deram com um enterro, cujo caixão estava seguido por centenas de pessoas. Era um caixão de rico pelos adornos. E numerosas pessoas. Pararam o caminhão e o tenente saltou e foi direto a quem lhe pareceu mais apropriado para lhe dar uma informação.

– De quem este funeral, senhor?

– Da Viúva Campos, a mais rica fazendeira daqui. Tão rica que já tinha encomendado o caixão há uns quatro anos e e trouxe o modelo de um ricaço americano. Queria igualzinho. E, quando se sentiu mal, já determinou como seria o funeral, missa de corpo presente, velas e flores. Todos os filhos e netos vieram de lá de baixo e de Curitiba, quando avisados. A missa vai ser rezada no cemitério pelo Monsenhor Harry, não pelo pároco, como sempre acontece…Gente rica é outra coisa….

– Sabe se ela tinha algum parente político?

– Só marido que foi vereador e prefeito daqui da cidade. Era estancieiro riquíssimo. Deixou uma fortuna que a falecida soube aumentar. Os dois filhos solteiros estão na Austrália estudando e surfando. E lá de baixo, Joinville, veio alguém? Não sei…..

Carlos Adauto Vieira

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