Morar em prédio

Tenho um primo que mora em Macapá. A cidade é uma bagunça, ele diz. O povo é muito folgado. Se alguém decide fazer uma festa na rua, simplesmente fecha o quarteirão e ninguém transita por ali. E ninguém faz nada! Por outro lado a cidade tem suas vantagens, ele pondera, e por isso “eu não saio de lá por nada”. Se eu quiser fazer uma festa na rua, fecho o quarteirão e me farto, pois ninguém faz nada!

Morar em prédio é como morar em Macapá. A fauna é variada, do pintassilgo ao orangotango. Há vizinhos simpáticos, prestativos, sempre de cara boa. Esses se tornam bons amigos. Há, outros, entretanto que, sai de baixo! São os que mais fazem barulho e os que mais implicam com o barulho que a gente faz! São aqueles que não conhecem as nuances e delicadezas da vida em conjunto e nem o significado da palavra tolerância. Ligam para o síndico se as crianças estão brincando, se o neném chora. Reclamam se sua mulher anda de salto alto. Alguém estacionou cinco minutos fora da faixa permitida? Alguém saiu da piscina e molhou um pouco o elevador? O cachorrinho, no colo, latiu para ele? Síndico!

São eles que não perdem uma reunião do condomínio. Geralmente se transformam nos poderosos membros do conselho. Os mais chatos querem tornar-se síndicos. São eles que redigem o regulamento do condomínio, a nossa lei. Acreditam que “o que é certo é certo; o que é errado, é errado”.

Essa turma precisa aprender que o mundo não é assim. O mundo é complexo, o comportamento das pessoas tem muito de imponderável. Para lidar com isto, melhor entender que rosnar. É justamente o comportamento flexível que fez nossa espécie vencer. Não somos fortes como os leões, nem rápidos como os leopardos e muito menos ágeis como os macacos. Somos mais inteligentes do que qualquer um deles e é aí que está a diferença: a flexibilidade no comportamento.

Não estou fazendo a apologia da bagunça ou da permissividade. Apenas preconizo a compreensão às diferenças e a maleabilidade ao lidar com as pequenas intercorrências. Sei que há um ponto em que não dá mais, que a tolerância precisa acabar. Concordo com a ação contra os mal-educados, contra os folgados de Macapá. Eles existem e, se não contidos, transformam a coabitação em um inferno. Entretanto, há como conter aqueles adolescentes que querem ouvir rock a todo som, até a meia-noite. E se o fazem uma vez ao ano, isso é vida, minha gente!

A vida boa acontece quando convivemos com gente boa. É muito bom servir a um vizinho quando ele precisa. É ótimo ouvir a campainha do apartamento e, ao abrir a porta, ver a vizinha com um pratinho de sobremesa. Receber um sorriso no elevador então, garante o seu dia.

A teoria dos jogos mostrou que a melhor maneira de conviver é confiar nos outros! Confiar de verdade. Se “o outro” pisar no seu pé uma vez, ainda assim é mais vantajoso continuar confiando. Agora, se pisar uma segunda vez, vá com tudo!

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