Nelci Seibel – Discurso de posse

– Dr. Udo Döhler, Prefeito de Joinville

– Dr. Rodrigo Coelho, Vice-prefeito e presidente da Fundação Cultural;

– Dr. Carlos Adauto Vieira, presidente da Academia Joinvilense de Letras;

– Dr. Carlos Adauto Virmond Vieira, Presidente de Honra da Sociedade Cultural Alemã de Joinville e Secretário de Estado de Assuntos Internacionais;

– Sra. Raquel S. Thiago, historiadora, minha amiga, orientadora e revisora dos meus trabalhos escritos e acadêmica que me indicou para participar desta Academia;

– Dr. Paulo Roberto da Silva, Secretário Geral da Academia, que não mediu esforços para que esta retornasse à atividade;

– Demais confrades que hoje serão empossados – Srs. Wilson Gelbcke e Marcelo Harger;

– Todos os membros da Academia Joinvilense de Letras, e que me deram seu voto para que eu integrasse à instituição;

– Meus familiares aqui presentes;

– Obrigada a todas as pessoas que vieram prestigiar este evento.

 

Ser convidada e aprovada como membro da Academia Joinvilense de Letras é para mim um grande orgulho e uma grande honra.

A honra é ainda maior, pelo fato de suceder uma das maiores personalidades de São Francisco do Sul, Manoel Deodoro de Carvalho, conhecido em seu tempo como “Seu Neco”.

Nascido em 13 de agosto de 1890, Manoel Deodoro desde cedo se tornou pessoa bem relacionada na comunidade e aos 17 anos comprou a casa em que funcionava a Farmácia Minerva, depois denominada “Farmácia Deodoro”. Farmacêutico licenciado e responsável devido à carência de médicos na época, ministrava consultas e receitava remédios conforme seus conhecimentos.

Seu sonho era erigir o 2º andar sobre as paredes da farmácia, o que ocorreu em 1946, quando efetuou também uma reforma geral. Seu Neco tinha o hábito de fazer anotações sobre todas as suas atividades.

 

Mais tarde mudou-se de São Francisco para o Rio de Janeiro, e o prédio ficou por muitos anos fechado, até que foi adquirido por Samir Deud (in memoriam), que fez nova reforma para instalar a sua loja.

Ao serem retirados os entulhos do prédio, Samir encontrou em meio a eles uma garrafa, contendo um manuscrito, intacto, que contava toda história da reforma e construção, destacando os nomes do mestre de obras, dos carpinteiros, pedreiros e serventes, bem como o salário de cada, um entre outros detalhes. Este documento foi assinado pelo Seu Neco em 1º de julho de 1946, e está reproduzido na íntegra, no livro “São Francisco do Sul 500 Anos – Construções Históricas”, que produzimos em 2004.

Manoel Deodoro foi um ilustre escritor, jornalista, conferencista e líder comunitário. Exerceu vários cargos públicos: foi vereador, presidente da Câmara, deputado estadual e juiz de paz, tendo o cuidado de anotar todos os atos, seus e de seus parceiros de luta em benefício da população local, que foram registrados em ordem cronológica, no livro “Memória e História – Anotações de Manoel Deodoro de Carvalho”, organizado pela historiadora Raquel S. Thiago.

A patrona

 É de praxe, que novos empossados na Academia de Letras, além de suceder um dos membros fundadores, elegem também um patrono ou patrona, escritor ou escritora do passado.

E como sempre tive grande admiração pela poetisa Júlia Maria da Costa, também francisquense, a escolhi como minha patrona na Academia Joinvilense de Letras.

Devo dizer ainda que sempre tive muito carinho por São Francisco do Sul, cidade mais antiga de Santa Catarina, sobre a qual já escrevi dois livros – Construções Históricas e História do Porto. E nestes trabalhos obtive grande apoio das autoridades e comunidade em geral.

Minha patrona Júlia da Costa nasceu em Paranaguá – Paraná em 1º de julho de 1844. Com o falecimento do pai, aos dez anos mudou-se com a mãe, que era francisquense, para São Francisco. Ali, em 1871, com 27 anos e já considerada “solteirona” para os padrões da época, casou-se com o comendador Francisco da Costa Pereira, 30 anos mais velho. Era considerado homem íntegro pela sociedade e com boas relações com as autoridades.

Embora o casamento de Júlia e o comendador não fosse movido pelo amor, o casal vivia em aparente harmonia, e sua residência era cenário de frequentes jantares, saraus e bailes, tornando-se referência da sociedade francisquense.

Júlia era uma mulher à frente do seu tempo. Inteligente, esforçava-se  para conquistar espaço, que até então pertencia somente aos homens.

Artista eclética, aos 23 anos já havia publicado dois livros de poesias, sendo considerada a primeira poetiza paranaense. Escrevia artigos para jornais catarinenses e paranaenses, tocava piano, fazendo os transeuntes pararem para ouvir. Pintava grandes e coloridos painéis, e de sua mente brotavam versos e muitos deles falavam dos seus sonhos não concretizados e da sua tristeza por um amor secreto e impossível.

Aliás, pesquisadores de sua biografia, definiram as poesias de Júlia em três fases: esperança, desilusão e demência. Falava de seus sonhos e esperanças, como:

Que sol que vida, que alvoradas belas,

Por entre murtas eu sonhava então

Quando ao perfume do rosal florido

Da lua eu via o divinal clarão!

 

À medida que o tempo passava, Júlia se tornava mais tristonha e desiludida, o que transparecia em seus versos:

 

Hoje, debalde no rumor das festas,

Procuro crenças que só tive um dia!

Minh’alma chora e se retrai sozinha,

O pó das lousas a fitar sombria!

 

Em 1º de dezembro de 1892 o comendador falecia, deixando Júlia da Costa desnorteada e solitária. Idealizava personagens, os personagens da sua vida para escrever um livro. Porém, em 1911, doente e com fortes sinais de demência, Júlia morreu sem concretizar este desejo. Além disso, destruiu quase todo o material que produziu durante sua vida, inclusive as suas fotografias. Contudo, os escritos de Júlia Maria da Costa estão guardados em alguns lugares, talvez conhecidos por poucos, e a romântica poetisa continua na lembrança dos francisquenses como uma grande e marcante personalidade do passado.

Cai na relva sem alento e vida!

Aí que desperta, se extingue o sonho!

Tão doce imagem para mim perdida!…

 

Muito obrigada!

 

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