Onévio Zabot – Discurso de posse

Ilmo. Sr. Engenheiro e Escritor Milton Maciel

  1. Presidente, da Academia Joinvilense de Letras

– Acadêmicos

– Autoridades

– Leitores e admiradores da última flor de lácio.

Prezados amigos, ao ser convidado pelo presidente Milton Maciel para ingressar na Academia Joinvilense de Letras, num primeiro momento confesso que hesitei, embora o honroso convite. Há outros escritores de maior envergadura que ainda não fazem parte desta academia; daí a apreensão.  Até porque – sinceramente -, me sinto mais um aficionado leitor do que propriamente um escritor.

É certo, porém, que de longa data escrevo artigos opinativos sobre agricultura, artigos publicados em diversos jornais de Joinville ao longo das últimas três décadas.  Artigos que resultaram na publicação do livro: Redescobrindo o Campo, recentemente lançado.

No entanto, antes disso, bem antes, a poesia faz parte da minha vida. Desde os 13 anos de idade versos me encantam. Ingênuos as vezes, mas apaixonados. Confundem-se com as areias do tempo.  Cheiro de terra, cio da terra, generosas palavras de Herculano Vicenzi.

A inspiração – a veia poética -, esta nasceu ao contemplar os   campos verdes, a paisagem, a luta dos agricultores que mesmo diante de dificuldades enormes extasiavam-se diante da natureza – obra prima do Criador.

Devo a minha mãe – Julieta Millani -, tal inspiração. Poetisa nata, embora jamais tenha escrito um verso. A sua maneira de apreciar a natureza, as flores, o cotidiano, e de expressar esta paixão, é sem dúvida, a mais pura expressão da arte poética.  Expressar-se com tamanha sinceridade, aquilo mexia com minha imaginação.

Por Deus! Sem querer acordei poeta. Portanto, valho-me deste ensejo – momento especial -, para homenagear dois ilustres personagens que engrandecem sobremaneira esta academia.  E, sobretudo a poesia catarinense. Falo do poeta João Batista Crespo – patrono da cadeira que tenho a honra de usufruir, e do eminente homem público e professor, Antônio Laércio Brunato – meu antecessor – pessoa de virtudes incomparáveis.

Sobre João Batista Crespo, lendo a obra Presença da Poesia em Santa Catarina, de Lauro Junkes, me deparo com sua rica biografia.

João Batista Crespo nasceu em Desterro, 7 de setembro, 1887, e faleceu em Belo Horizonte, em 1966.

Curso primário com os professores: Luís da Neves e José Brasilício de Souza.

Em seguida cursa no Liceu catarinense.

Estuda português, rima e métrica com o renomado professor Venceslau Bueno.

Seus versos merecem acolhida nos jornais:  O Tempo, Folha Nova, o Estado e nas Revistas: Fênix e esperança.

Em 1922 transfere residência para Jaraguá do Sul – exerce por 20 anos o cargo de escrivão e coletor de rendas federais. Ali casa com Anésia Maria Walter; quatro filhos.

De 1922 a 1945 redatotoriu o Jornal Gazeta do Povo.

Em Blumenau com Honorato Tomelin funda o periódico O LUME.

A partir de 1950, em Joinville, colabora com a Revista Vida Nova.

Pública poemas líricos-épicos sobre a colonização a cidade dos príncipes.

Como fundador, ocupou a cadeira 27 da Academia Catarinense de Letras.

Publicações dispersas, escreveu também peças teatrais, letras de músicas.

Para o centenário de Blumenau escreve a peça – A Conquista. Causou sucesso a apresentação no teatro Álvaro de Carvalho – Revista Zé Catarina – com letra sua e música de Álvaro de Souza.

Reservado e tímido, porém prolifero.

Segundo depoimentos de sua esposa, Nésia W. Crespo(…) – “Era profundamente sentimental. O senso descritivo era dominante em sua poesia. Excentricamente gostava   de escrever as suas rimas em papel velho, acetinado pelo tempo (…) Sua pena não cessava, sempre encontrava motivo para inspiração(…) não consentia que se tocasse em sua mesa de trabalho ou que o perturbassem quando escrevia.

De Crespo. Ora de Crespo, um poema, o clássico Teatro de Bonecos.

TEATRO DE BONECOS

Este mundo é o melhor teatro de bonecos,

Onde o acaso controla encenações esparsas

Que faz rir, chorar…- reproduzindo os ecos

Da vaia ou do aplauso aos tréfegos comparsas.

 

Alguns vestem casacas, outros blusões, jalecos,

Conforme o ambiente em que se dão as farsas.

Mas não passam, no fim, de míseros bonecos:

Um pouco de matéria envolta em talagarças!

 

No entanto, cada qual parece mais humano

Nos gestos, no falar, no bem ou mal que se faz,

Quando finge de herói, de magnata ou tirano.

 

E quando alguém aplaude o homem do jaleco,

Gritando: Muito bem! – para fazer cartaz,

Esse alguém não passou de um autêntico boneco.

 

E sobre o homem púbico – o eminente professor Antônio Laércio Brunato, graças a informações obtidas dos familiares – Dr. Paulo Brunato – que grata surpresa.   Cidadão de envergadura incomum.  Que rica trajetória.

Nasceu em Jaguariaíva/PR – 12/10/1920 -, e faleceu em São Francisco do Sul – 9/8/1992.

Contador – Academia de Comércio do Rio de Janeiro

Bacharel em Direito – Faculdade de Direito de Curitiba.

Professor, líder comunitário e político. De temperamento afável e carismático.

Atividades literárias – Jornal O Estudante – fase estudantil.  Em 1937 publica na imprensa paranaense – duas vezes por semana na Gazeta do Povo – Gazeta Feminina e Gazeta Literária.

Colabora com o jornal O Dia e Correio do Paraná.

Publica também na Revista Prata de Casa.

Trabalhos são divulgados semanalmente na Rádio Clube – programa Hora literária Eolo de Oliveira.

Em 1941 segue para o Rio de Janeiro, servindo ao exército brasileiro, permanecendo por 4 anos em razão da II Guerra Mundial.

Volta a Curitiba, mesmo no exército segue escrevendo ingressando na Academia de Letras José de Alencar, como fundador da cadeira que tem como patrono Mário de Andrade. Isso no início de 1944.

Em 1945, a conselho do poeta Silveira Netto, pai de Tasso Silveira submete o seu primeiro livro – Pálio Verde -, à apreciação de Bastos Tigre que recomenda a publicação que é feita através da editora à Noite.

Em 1946, a trabalho, retorna ao Rio de Janeiro.

Em 1951 volta para Curitiba. Em 1952 contrai matrimônio com Idamar da Silveira, filha do procurador da firma Carlos Hoepke. Neste mesmo ano é nomeado para o Lloyd Brasileiro.  Passa a residir em São Francisco do Sul.

Em 1955, assume as funções de Corretor de Navios junto à Alfandega de São Francisco do Sul, nomeado pelo Presidente Getúlio Vargas por obter o primeiro lugar no concurso.

A literatura, sua paixão maior. Vários livros de poesia, contos e pensamentos por publicar.

Foi professor da Escola Técnica de Comércio de SFS, e diretor por 19 anos. Lecionou e dirigiu o Colégio Normal SC.  Foi professor de português no Colégio Agrícola senador Carlos Gomes de Oliveira por mais de 22 anos.

Membro do Lions Clube de SFS, sendo sócio fundador, exercendo funções de comando em vários momentos.

Vereador eleito por três legislaturas, sendo três vezes presidente da Câmara de SFS.

Sua obra mereceu elogiosas considerações de: Durval Borges, Eolo de Oliveira (este diretor da Gazeta do Povo), Dom Aquino Corrêa, Arcebispo de Cuiabá e membro da Academia Brasileira de Letras, Carvalho Nascimento, Gabriel Fontoura, Silveira Netto, Tasso da Silveira, Bastos Tigre, Jorge de Lima, Ilmar Carvalho, Olegário Mariano, entre tantos outros eminentes escritores.

Estas informações sintetizadas constam do pronunciamento de sua filha, Ida Beatriz, em 11 de outubro 1985, ocasião em que recebeu uma homenagem especial no Museu Histórico de SFS ao lançar o livro:  Pensamentos e Reflexões.  Publicado por recomendação de Austregésilo de Ataíde, da Academia Brasileira de Letras.

De coração agradeço, ao Dr. Paulo Silveira Brunato – filho de Antônio Laércio, e dona Denise, sua esposa que residem em Florianópolis. E também ao ex-prefeito de Araquari – Francisco Garcia -, que conseguiu o contato para obter estas preciosas informações.

Quanto ao ilustre mestre Antônio Brunato – responsável pela formação de gerações e gerações de jovens francisquenses, muitos dos quais notáveis em diversas áreas do conhecimento, e no Colégio Agrícola de Araquari – jovens do país inteiro.

Frase lapidar no epitáfio – cemitério de São Francisco do Sul, onde repousa o velho guerreiro -, o imortaliza, revelando sua grandeza:

 

“Fui mestre como Cristo e os meus dias gastei ensinando, aconselhando. Agora, embora morto, mas DESEJOSO de continuar meu ministério, aqui estou. Pergunte, que eu responderei, através da inspiração”.

 

Quanto a este modesto poeta, confesso que publicar livro foi mais um ato de sorte do que propriamente uma obsessão a perseguir-me.

Eis que, inadvertidamente, dia desses entreguei um rascunho de poemas ao jornalista Herculano Vicenzi. Sorte e o que mais.  Enquanto não publiquei a obra o mesmo não largou do meu pé.  Sorte ainda maior encontrar o editor Joel Ghelen.  Prontamente se propôs a dar um esboço – uma linha de coerência aos esparsos poemas.  Sai o livro Arco de Pedra. Ano 2000. Confesso que a contribuição de Fernando José Karl, Paulo César Ruiz e Germano Jacob foram fundamentais para dar escopo à obra. A apresentação de Germano Jacob, de saudosa memória, é comovente. Apaixonante mesmo.  E a de Fernando karl engrandece a obra ao destacar…” A música da palavra escrita empresta à imagem toda a plenitude do objeto amoroso”. E Herculano, emeda: “Arco de Pedra é uma obra para ser lida e recomendada”.

O lançamento no Mercado Público Municipal – um evento memorável de público e de cachaça do Max Mop, só é superado pelo lançamento em Florianópolis no Palácio Cruz e Sousa. Quatro cavaleiros do apocalipse ciceroneados por Joel Ghelen atravessaram a ponte Pedro Ivo Campos. Carlos Adauto Vieira à frente, seguidos de Orlando Alves, Paulo César Ruiz e este humilde poeta. Sobrou livro e faltou pinga. Levo uma boa cachaça do Fleith. Seis anos curtida em barril de carvalho. Saborosíssima.  A frustração: poucos ilhéus presentes, mas que atrevidamente não se deram por satisfeitos com apenas um garrafão. Queriam mais.  Ressabiados, e sem sequer uma fotografia para registrar o feito histórico damos o fora, não sem ouvir de Olsen – contista bissexto- de que poeta que vaza antes da meia noite tem pouco futuro.

Confesso embaraçado, o que dizer num momento como este. Obviamente emoções afloram.  E embora necessárias, nem sempre são a melhor companhia.

Aproveito, no entanto, o ensejo para enaltecer o brilho da poesia e dos poetas joinvilenses de todas gerações.  Desde o grupo de o Cordão, aos Zaragatas, à Confraria das Letras e a Associação das Letras. Ouso citar alguns destes expoente, não necessariamente pela ordem de importância ou pela cronologia do tempo:  Eunaldo Verdi, de saudosa memória, Alcides Buss, Mila Ramos, Caco de Oliveira, Rita de Cássia Alves, Dúnia de Freitas, Apolinário Ternes, Rubens da Cunha, Fernando José Karl, Paulo César Ruiz, Vilmar de Souza, Valmir Neitsch – o capim, Patrícia Ohffmann, Silvia Vieira, Ramone Abreu Amado, Donald Malschitzky, entre tantos outros. E há os históricos Volfang Moon, Inácio Bastos e João Batista crespo.

Prezados amigos, delongas à parte, resta-me neste momento, apenas agradecer. Agradecer ao Herculano Vicenzi que me meteu nesta encrenca. Ao presidente Milton Maciel que me fez o honroso convite. E a vocês amigos acadêmicos que ousaram deferir a indicação, acolhendo-me ao voo mais alto- ao ninho das águias.

Memento Mori, no entanto. Que o momento sirva para que, com mais humildade ainda possa servir, e sobretudo aprender com os mais experientes. Experientes amigos que reencontro nesta academia.

De coração, agradeço também à minha esposa, Ângela Maria Miers Zabot – companheira de todas as horas -, pela sua infinita paciência.  E aos meus filhos: Alexandre e Paulo, ambos apreciadores do vernáculo. E às noras: Cristiane – jornalista e Júlia – arquiteta. E aos meus netos e netas: Pedro, André, Joana, Catarina e Teresa.  E Antônio e João.  Se acaso esqueci de citar ou agradecer a alguém, perdoem-me.

A todos, de coração, muito obrigado. Muito obrigado mesmo. Um grande e afetuoso abraço.  Fraternal abraço.

 

Onévio Antônio Zabot

Academia Joinvilense de letras – discurso de posse.

Joinville 24 de julho, de 2018

 

 

 

 

 

 

COMPARTILHE: