📖 Maria Cristina (Marinaldo)

TEXTO-PRESENTE para MARIA CRISTINA DIAS

Eu tenho a intuição de que Maria Cristina Dias, ao devorar livros quando criança, e com orgulho carregar suas fichas de leitura e apresentar sua carteirinha de livros emprestados, brincava de imitar as personagens que lia, e em algum momento se viu Alice adentrando uma porta menor do que seu tamanho, e encontrando espaço para dizer “sou mulher de adaptações porque quero avançar no tempo”. Tenho a intuição – conceito este que ela tão bem explorou em uma de suas crônicas – que Maria Cristina carrega a doçura de tudo o que era pra ser cristiano, e apagaram: como os lírios do campo curvando-se à força motora do vento, como a voz mansa de um pastor que enxerga a ovelha atrevida e se alegra com ela, e inclusive, uma sobrancelha que se arqueia para falar por si mesma, algum atrevimento que sua voz educada irá em algum momento fustigar.

Eu tive que ler um pouco sobre Maria Cristina para ir além das minhas impressões adocicadas. O primeiro impacto desse cometa que carrega dois nomes tão santos foi sua voz: é como se ao ouvi-la, eu fosse sendo conduzido para dentro de um filme que eu gostaria de assistir pela trigésima segunda vez. A sensação sensorial me lembrava de vozes de mulheres austeras que me trariam o sortilégio da calma.  A forma como pronuncia a palavra com tanto respeito, o cuidado com cada fonema, as pausas, atacou o meu olhar dentro do ouvido, e eu comecei a lê-la –  leitura inescapável porque ela se comunica com gestos, tanto quanto com esse som deliciosamente fluminense e ensolarado. Acho que sua voz invade, como água de rio, flumínea feito sua gentilícia raiz.

Maria Cristina atua nos bastidores do tempo. É uma outra pessoa, dentro desta Academia, que faz da história a glória da sua poesia crônica. Revendo o que disse, encontrei Dona Juta, que até então para mim era o que minha mão me diria “vai lá e compra um metro de juta”, e ao ler sua história, aquele tecido virou um texto que parece ser tão lindo em sua memória, Um texto pessoa com nome de história, de tecido, de gente, de planta… Mas eu creio que entender nossos amigos pelo que eles dizem –  e nem sempre é diretamente pra nós –  é um exercício também intuitivo, e arriscado. Mas eu corro o risco. Faço desse ato um Akai Ito, ou um fio vermelho que nos une, como diria o filho de Maria Cristina, apontando à mãe o fio condutor para que esta escrevesse um texto delicado. É bonito encontrar poesia disfarçada de cronica, poesia disfarçada de história! Embora eu sinta o texto jornalístico, o que flui é a verve poética da mulher que se encanta com um “céu escandalosamente azul visto pela janela” e reflexões como “É difícil deixar alguém falando sozinho, mesmo quando esse alguém é um personagem fictício” o que mostra seu respeito por tudo o que é vivo: porque a literatura é uma entidade, viva, que nos cresce, que nos faz, que se intromete em nós, que está presente. E isso é visível em Maria Cristina. Intuo que pelo profundo respeito que tem pela leitura de tudo, do mundo e de si mesma, consegue chegar ao posto de Presidente com a mesma simplicidade como se colhesse flores, como se vendesse flores, como se fosse uma delas, inclusive. Vejo nela as presenças ilustres de sua leitura, falando com ela por meio dos seus gestos, da sua entonação, da ação viva e fluída do que lhe orienta. “Falamos com gestos, com o olhar, com o tom da voz, como os silêncios e com os arroubos”. Eu pensei nessa assertiva Mariacristiana, e me identifiquei com ela. Fiquei alegre porque poderia falar, neste dia do seu aniversário, sobre esse fato histórico que deve ter sido seu nascimento. Intuo que sua mãe, clareadora, tinha pra ela alguns presentes comprados. Soube que foram diversos. Suponho que alguns foram passeios, campos, gestos, textos, gentes, calmas, almas, balanças, versos.

Maria Cristina Dias
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