Odisseia de uma mesa na Lyra (Hilton Görresen)

 

ODISSEIA DE UMA MESA NA LYRA

Hilton Görresen

 

Quem sobe a escadaria do clube Harmonia Lyra, hoje reformado, no terceiro pavimento, acima do grande salão, vai encontrar uma mesa majestosa, hierárquica, de antigos tempos, com seu grupo de cadeiras de espaldar alto. É ali, naquele pavimento e naquela mesa, que os membros da Academia Joinvilense de Letras fazem suas reuniões mensais. No canto da sala, a estante da biblioteca, que procura resgatar e manter a obra dos autores joinvilenses e de alguns ícones catarinenses. Uma parceria entre o clube tradicional e a cinquentenária Academia.

Mas não foi fácil a instalação da citada mesa nesse local. Imaginemos (e quando digo imaginemos significa que não se deve acreditar muito na história), a odisseia desse móvel até chegar à situação atual.

Primeiro, é preciso lembrar que a mesa foi utilizada para as reuniões que objetivaram a criação da Academia, no longínquo ano de 1969. Talvez por isso, consta informalmente que foi doada pela Prefeitura ao nascente sodalício (vamos usar o dicionário, hehehe). Como a Academia, por um motivo ou outro, ficou dormitando por alguns anos (mas acordou com força e determinação em 2013), tornou-se um mistério o paradeiro da mesa. Alguém lembrou que a havia visto na Biblioteca Pública, praticamente sem uso. Aliás, servia apenas para que jovens desrespeitosos sentassem em cima, como se fosse a casa da sogra, sem respeito ao recato do ambiente.

O eficiente secretário da sociedade elaborou um ofício à biblioteca, solicitando a devolução do bem (quando se trata de patrimônio do governo é conveniente mencioná-lo como bem, mesmo que seja um traste, o que não era o caso da mencionada mesa). A resposta da diretoria da biblioteca veio rápida, desconfio que queria livrar-se com urgência daquele “antro de moleques”. Teria o maior prazer em fazer a “devolução” do bem, mas este era propriedade do departamento de água e esgotos, ao qual deveria ser encaminhada a solicitação. E escrevendo isso, pegou o contínuo e o segurança e mandou devolver a mesa, mediante ofício, ao departamento competente.

Ao receber aquele bem não solicitado, o diretor mandou examinar os controles e descobriu que a mesa havia sido deixada naquele departamento pela secretaria de obras públicas, por falta de lugar em suas salas. Com o devido ofício, a mesa foi reencaminhada àquele órgão. O surpreso diretor de obras ficou aliviado quando se verificou que a origem do cada vez mais pesado bem, segundo seus pobres carregadores, era a sala do prefeito. Toca pra lá.

A secretária do gabinete não quis receber o bem. Pediu, no entanto, ao contador para verificar seu registro. Estranhamente, a mesa não constava dos registros da prefeitura.

– Não podemos receber, nem fazer devolução de um bem que não possuímos – disse.

E agora? Alguém lembrou de pedir informações ao mais antigo servidor do órgão, já passado da época de aposentadoria.

– Aquela velha mesa? Me lembro sim. Foi comprada para o acervo da biblioteca. Não sei como veio parar aqui.

Assim, por marchas e contramarchas, a mesa estacionou na sala do Harmonia Lyra.

 

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