Hilton Görresen – Fundador
Cadeira 9
Patrono Carlos da Costa Pereira
O acadêmico Hilton Görresen é natural de São Francisco do Sul (SC), bisneto de imigrante norueguês aqui chegado no século 19.
Começou a publicar seus textos na década de 1960, no jornal Correio do Povo, de Jaraguá do Sul (SC). Entre as décadas de 1970 e 1980, após concluir o curso de Letras, em Joinville, iniciou colaboração semanal no jornal “A Notícia”, publicando crônicas, num estilo leve e humorístico, e artigos sobre comunicação.
Terminando curso de especialização em Língua Portuguesa, em 1990, passou também a elaborar textos sobre linguagem, alguns deles reunidos mais tarde no livreto “Mostrando a língua”, de 2004.
Há cerca de 10 anos, vem publicando suas crônicas no jornal Notícias do Dia, também de Joinville, textos estes reunidos nos livros “Quando minha avó tirava a roupa”, “Histórias para ler no banheiro” e “Elefante branco”.
Publicou também um livro de memórias, “São Chico Velho de Guerra” e o paradidático “O que aprendi sobre redação – e posso lhe ensinar”.
É membro também da Associação das Letras e da Academia de Letras e Artes de São Francisco do Sul – ALASFS.
Crônica de inverno (Hilton Görresen)
CRÔNICA DE INVERNO Hilton Görresen Não sinto muita simpatia pelo inverno. Se ele fosse uma pessoa, me recusaria a sentar na mesma mesa. Talvez seja porque sou apaixonado pelas estações médias, outono e primavera, nessa ordem. Tenho uma forte relação psicológica com essas estações, coisa do tempo de menino.A primavera iniciava com a […]
Cachaça, já tenho… (Hilton Görresen)
CACHAÇA, JÁ TENHO… Hilton Görresen Antes que o prezado leitor me tenha em conta de pinguço, cachaceiro e outros adjetivos de significado etílico, devo esclarecer que não é de minha pessoa que estou falando (ou melhor, escrevendo). Há algum tempo, em frente a um supermercado, um provável indigente me abordou, de modo alegre […]
Tutti buona gente (Hilton Görresen)
TUTTI BUONA GENTE Hilton Görresen Morro de inveja dos artistas participantes de programas tipo “esta é sua vida” ou “homenagem ao artista”, nos quais amigos e parentes dão depoimentos sobre a pessoa em destaque. Todos os homenageados, sem exceção, são modelos de virtude. Todos são bons pais, generosos, humildes, ótimos amigos e colegas. Tutti […]
A vaca foi pro brejo? (Hilton Görresen)
A VACA FOI PRO BREJO? Hilton Gorresen Esses dias me perguntaram se o correto é dizer “seis pães franceses” ou “seis pães francês”. Respondi, de cara, levando em conta a norma gramatical: seis pães franceses. Momentos depois (tenho faísca um pouco atrasada), começou a se agitar em mim uma dúvida. Pera aí, o […]
A aventura dos acomodados (Hilton Görresen)
A AVENTURA DOS ACOMODADOS Hilton Görresen Todas as noites vamos dormir com uma grande incerteza: que será que nos vai acontecer durante o sono? Vamos ser devorados pelo enorme dragão? Vamos nos quedar sozinhos e nus diante do mundo? Vamos conseguir atravessar o precipício que encontramos pela frente? Vamos ser interrompidos pela tia […]
Razões para mudar de endereço (Hilton Görresen)
RAZÕES PARA MUDAR DE ENDEREÇO Hilton Görresen Você recebe proposta para um emprego em outra cidade. A cidade é boa, tamanho médio, bem-organizada. Para convencer a família a se mudar, você passa a relacionar os benefícios da troca de endereço: a maioria dos parentes está morando lá, tenho meus irmãos, primos e tios. […]
Quando vim para Joinville (Hilton Görresen)
QUANDO VIM PARA JOINVILLE Hilton Görresen Quando vim para Joinville, a cidade era deliciosamente provinciana. Vim com minhas lembranças de menino, nas eventuais visitas à cidade: o ônibus da Viação Vogelsanger, a parada em Araquari – galinhas ciscando nas ruas de terra –, os casarões avarandados, os cafés com bolo na confeitaria Dietrich, […]
Como ter fluência (Hilton Görresen)
COMO TER FLUÊNCIA Hilton Görresen Você gosta de dançar? Ou de praticar surfe? Pois é, ter fluência (eu disse fluência, não flatulência) é ter a habilidade de fazer o texto deslizar, como numa dança, ou como uma prancha sobre as ondas. Ao lê-lo, o leitor tem aquela sensação de que as palavras se […]
Papai Noel esteve aqui (Hilton Görresen)
PAPAI NOEL ESTEVE AQUI Hilton Görresen Putz, que humilhação. Calorzão de dezembro, eu com essa barba incômoda, travesseiro na barriga, roupinha vermelha. Pescoço empapado de suor. Mas não tinha jeito, eu estava duro, completamente durango kid. Me ofereceram este bico de Papai Noel. Se os amigos de boteco me vissem ia ser aquela […]
O dia em que vi Papai Noel (Hilton Görresen)
O DIA EM QUE VI PAPAI NOEL Hilton Görresen Quando era garoto, o Natal lá em casa não tinha muita comilança nem “bebelança”. Às 19 horas, minha mãe postava a mesa e sentávamos para o que conhecíamos por jantar de Natal: arroz, maionese e galinha recheada, sem esquecer da sobremesa. Comer galinha não […]
Relações de amor e ódio com o elevador (Hilton Görresen)
RELAÇÕES DE AMOR E ÓDIO COM O ELEVADOR Hilton Görresen Se há algo que pode marcar a vida de uma pessoa, esse é a primeira vez em que fez alguma coisa. A primeira vez em que a Dercy Gonçalves disse um palavrão. A primeira vez em que o Papa rezou o “Pai Nosso”. […]
Crônica de inverno (Hilton Görresen)
CRÔNICA DE INVERNO Hilton Görresen Não sinto muita simpatia pelo inverno. Se ele fosse uma pessoa, me recusaria a sentar na mesma mesa. Talvez seja porque sou apaixonado pelas estações médias, outono e primavera, nessa ordem. Tenho uma forte relação psicológica com essas estações, coisa do tempo de menino. A primavera iniciava com […]
O “né?” Catarina (Hilton Görresen)
O “NÉ?” CATARINA Hilton Görresen Uma das características mais notadas no catarinense é o uso da expressão “né?” no final de quase toda frase. Observe quando um grupo de reportagem pega um transeunte desprevenido e o entrevista. As respostas sempre vêm com uma saraivada de “nés”. Pessoas de outros estados sempre acham que […]
Quem vende o quê? (Hilton)
QUEM VENDE O QUÊ? Crônica de Hilton Görresen Passando por uma loja da cidade, encontrei o seguinte aviso: “Admitem-se vendedores”. Tudo como manda a sagrada gramática. Aleluia! Meu assessor, o professor Linotipus (emérito caçador de placas e anúncios), ficou eufórico, mandou até rezar uma missa para seu protetor São Napoleão (Napoleão Mendes de Almeida, […]
História e evolução do conto (Hilton Görresen)
História e evolução do conto Hilton Görresen Neste passeio sobre a história e evolução do conto, considero o conto em sua característica de contar uma história curta, o que me leva a incluir nele não só o texto considerado literário, mas outros tipos de narrativa, como o conto de fadas, de terror, de […]
O velho e o menino (Hilton Görresen)
O VELHO E O MENINO (homenagem a Hemingway) O velho Maneco estava há três dias no mar, segurando na linha um enorme espadarte. Ele o havia visto por breve momento quando o peixe dera um salto fora d’água, as escamas rebrilhando ao sol. Agora, o peixe dava voltas sob a superfície, preso ao […]
Odisseia de uma mesa na Lyra (Hilton Görresen)
ODISSEIA DE UMA MESA NA LYRA Hilton Görresen Quem sobe a escadaria do clube Harmonia Lyra, hoje reformado, no terceiro pavimento, acima do grande salão, vai encontrar uma mesa majestosa, hierárquica, de antigos tempos, com seu grupo de cadeiras de espaldar alto. É ali, naquele pavimento e naquela mesa, que os membros da […]
Lembranças do vento (Hilton)
LEMBRANÇAS DO VENTO Hilton Gorresen Não sei se é porque sou um sinestésico, de acordo com a neurolinguística, mas meu histórico de vida é formado por sensações. Imagens são nuvens que se desvanecem em minha memória, se transfiguram em sombras. Mas me apreendo pelas sensações. Foram cicatrizes de alegria, tranquilidade, euforia, vergonha, amor […]
O bêbado e o batráquio (Hilton)
O BÊBADO E O BATRÁQUIO Hilton Görresen Sem saber como, foi parar no chão enlameado (mas nós sabemos como: saiu do bar, deu alguns passos trôpegos, deslizou na lama e foi de nádegas no chão). De olhos entreabertos, avistou um pequeno ser esverdeado, parado em sua frente e que o olhava com curiosidade. Era […]
Quero de volta a primavera (Hilton)
QUERO DE VOLTA A PRIMAVERA Hilton Görresen É, caro leitor, a estação primaveril está quase terminando, mas a primavera não deu as caras. Foi só chuva e chuva (desconfio que este texto já foi publicado mas é daqueles que sempre está valendo. Mudando a estação, é só trocar “primavera” por verão ou inverno […]
Como é bonito imaginar (Hilton)
COMO É BONITO IMAGINAR… Hilton Görresen Em meus delírios de imaginação (frutos da leitura de gibis e dos filmes americanos na infância), sonho que pertenci à Legião Estrangeira, no norte da África, para onde se refugiavam os que desejavam esquecer seu passado ou que, por algum motivo, resolviam fugir de sua pátria. Enfrentei bravamente […]
Ac. Hilton Görresen leu “Carmen”, de Prosper Merimée
CARMEN – Prosper Merimée Muitos apreciadores da belíssima ópera Carmen desconhecem o livro em que se baseou a obra, muitas vezes transformada também em filmes; um dos mais belos é Os amores de Carmen, com Rita Hayworth. Seu autor, o francês Prosper Merimée (1803–1870), foi, além de escritor, arqueólogo e filólogo, características que bem […]
Turismo Poético (Hilton)
TURISMO POÉTICO Hilton Görresen Quando criança, adorava ouvir uma música, há muito tempo esquecida: “vem viver o sonho lindo/que eu vivi/dentro dessa maravilha/ que se chama Guarapari”. Eu nem sabia onde ficava a tal de Guarapari. Mas a melodia era suave, gostosa, e eu imaginava uma Guarapari de sonho, romântica, misteriosa. É isso que […]
Surto de nostalgia (Hilton)
SURTO DE NOSTALGIA Hilton Görresen Às vezes, acordo com um surto de nostalgia. Sensação indefinida, talvez por ter me tornado adulto sem um acerto de contas com a juventude. A memória é quem cria (ou filtra) as lembranças, mas algumas delas escapam do “script” da chamada “época boa”, de paraíso perdido num tempo mágico e […]
Por que matei Rocky Lane (Hilton)
POR QUE MATEI ROCKY LANE? Hilton Gorresen Esse é o título de meu (penúltimo) livro de contos. O personagem do conto que empresta seu nome à obra é um escritor de livros de faroeste que ajusta contas com seu herói da infância. Rocky Lane foi um astro dos filmes de faroeste e dos gibis […]
📖 Receita para conto policial (Hilton)
RECEITA PARA CONTO POLICIAL Hilton Görresen É fácil escrever um conto policial. Em primeiro lugar, deve acontecer um crime. Conto ou romance policial sem crime é como praia sem mar, cerveja sem álcool, Claudinho sem Buchecha, etc., etc. Evidentemente, se há um crime, tem de haver uma vítima. Vítima é aquela que geralmente aparece morta […]
O bêbado e o batráquio (Hilton)
O BÊBADO E O BATRÁQUIO Hilton Görresen Sem saber como, foi parar no chão enlameado (mas nós sabemos como: saiu do bar, deu alguns passos trôpegos, deslizou na lama e foi de nádegas no chão). De olhos entreabertos, avistou um pequeno ser esverdeado, parado em sua frente e que o olhava com curiosidade. Era o […]
A cabeça do leitor (Hilton)
A CABEÇA DO LEITOR Hilton Gorresen Cabeça de leitor é imprevisível. Não entendam mal, meus dois ou três leitores, falo no bom sentido. Uns adoram o texto anedótico, em que tudo converge para uma conclusão hilária; outros se pelam por uma mensagem positiva, muitas vezes provocando lágrimas. Outros, mais intelectualizados, preferem o texto acadêmico […]
Você já leu Gabriela? (Hilton)
VOCÊ JÁ “LEU” GABRIELA? Hilton Görresen Gabriela, Cravo e Canela é, no meu entender, o mais delicioso livro de Jorge Amado. Foi um dos primeiros que li na adolescência. O ideário comunista, que o autor seguia, trouxe para a literatura a valorização dos membros das classes baixas. Mas quero conversar sobre a leitura e sua […]
📕 Vocabulário de palavras infrequentes (Hilton)
VOCABULÁRIO DE PALAVRAS INFREQUENTES Contribuição: HILTON GORRESEN Aborígine – Que nasceu no país ou local onde mora; primitivos habitantes de um local, antes de entrar para a história, de origem desconhecida. O contrário de exótico. Acrimônia – azedume, tratamento indelicado, aspereza, rispidez. Ad referendum – decisão tomada, a ser referendada por um conselho ou assembleia. […]
A lenda do gambá (Hilton)
A LENDA DO GAMBÁ Hilton Görresen Ultimamente, um gambá tem visitado meu quintal. Os desprotegidos sacos de lixo amanhecem furados, cascas de ovo e de batata espalhadas no chão. Algumas vezes sua ousadia o leva a entrar em casa, à noite, farejando os armários da cozinha. Isso despertou minha curiosidade a respeito do animal. […]
📕 “Importância da linguagem” (Hilton)
IMPORTÂNCIA DA LINGUAGEM Hilton Gorresen Se me perguntarem qual a maior invenção humana, direi sem pestanejar que foi a linguagem. Pela linguagem é que apreendemos, ordenamos e expressamos a realidade. Tente formular um só pensamento sem se valer da linguagem. Impossível, pois linguagem e pensamento se confundem, são as duas faces da mesma moeda. […]
📓”Os brasileiros falam errado?” (Hilton)
OS BRASILEIROS FALAM ERRADO? Mudanças históricas na língua falada Hilton Gorresen A Língua é uma ferramenta que todos nós usamos, por isso é importante saber mais sobre ela, inclusive para combater ideias e preconceitos do lugar-comum sobre ela. Se atentarmos a uma conversa comum de brasileiros, vamos ouvir coisas como “butina, cumida, bixiga, ou […]
Ofensas (Hilton)
OFENSAS Hilton Görresen Este mundo anda muito violento. Veja no trânsito: motoristas não têm mais paciência, qualquer deslize do próximo lá vêm xingamentos, insultos, buzinaços. Então o próximo, mesmo um pouco afastado, faz um gesto obsceno, insultuoso, e começa a briga, muitas vezes com fim trágico. Soube, através da internet, de um caso em que […]
📘”Não consinto que sejas sucinto” (Hilton)
NÃO CONSINTO QUE SEJAS SUCINTO Outro dia, um leitor de minhas crônicas me falou (ou reclamou, sei lá): teus textos estão muito sucintos. Quase disse: não consinto que sejas sucinto. Sucinto é o mesmo que conciso, breve, condensado, compactado, etc. É um texto magrinho, um texto sem lipídios, sem firulas (consegui explicar ou compliquei mais?). […]
Minhas dúvidas sobre Papai Noel (Hilton)
MINHAS DÚVIDAS SOBRE PAPAI NOEL Hilton Görresen Eu não acreditava em Papai Noel, acreditando. A gente nunca sabe… Dizem que o bom velhinho, apesar de toda aquela pança, entrava em nossa casa pela chaminé. Mas como, se lá em casa não havia chaminé? Meu pai nos mandava sair e ficar aguardando no cais em frente, […]
📖 “Flunflação” (Hilton)
FLUNFLAÇÃO Ainda não inventei a palavra acima. Teria alguma coisa a ver com inflação? Não sei, o sentido das palavras às vezes engana, muitas não são o que parecem ser. Lutulento, por exemplo, nada tem a ver com luto. Negacear, nada com negar. Mas diga-me uma coisa: se já houvesse sido inventado, qual seria […]
Campanha eleitoral (Hilton)
CAMPANHA ELEITORAL Hilton Görresen Nesta época, assistimos pela televisão centenas de candidatos, a maioria para nós desconhecidos, a jogarem no ar seus apressados discursos. Alguns são “macacos velhos”, buscando reeleição, outros são ingênuos bem ou mal intencionados, prometendo o que dificilmente poderão fazer. Parece que houve uma “democratização” das candidaturas, uma espécie de pegue e […]
Mas você comeu da pizza (Hilton)
MAS VOCÊ COMEU DA PIZZA… Hilton Görresen Nosso mundo está desabando (com lugar-comum e tudo) Nossos heróis estão recolhidos Com suas estátuas pontilhadas De cocô de passarinho Enquanto ladrões de casaca Roubam nossos olhos. Mas você comeu da pizza… Barrigas atentas vislumbram A colheita do vizinho Sapos coaxam no banhado Com os papos inchados de […]
Meu pedreiro (Hilton)
MEU PEDREIRO Hilton Görresen Na época em que cismei de construir um “puxadinho” lá em casa, aprendi muita coisa com meu pedreiro. Seu Jorge era um cinquentão alegre, de rosto vermelhaço e bigode branco. Aparentava ser mais velho do que era, curtido pelo trabalho de longos anos debaixo do sol. Coisa rara, não […]
O que é a Academia? (Hilton)
O QUE É A ACADEMIA? Hilton Görresen Alguém já disse que uma academia de letras é só uma associação metida a besta. Não no sentido tirirical de bestagem, mas pelo costume (eu diria obrigação) de manter rituais e tradições. Segue nisso o modelo criado pela academia francesa. Seus membros são 40 e somente há rodízio […]
Quero falar com meu pai (Hilton)
QUERO FALAR COM MEU PAI Hilton Gorresen A mulher terminou de limpar o banheiro, deixou uma pedrinha sanitária pendurada na borda do bacio, e foi colocar o arroz para cozinhar, quando trilou a campainha da porta. Deve ser o guarda noturno do quarteirão que vem cobrar a mensalidade, pensou. Esse pessoal vem sempre nas horas […]
Falando de sexo… (Hilton)
Falando de sexo… Hilton Görresen Você achou que eu ia contar alguma história picante? Cabecinha suja, hein? Vou falar de sexo, mas é do sexo das palavras. Que o feminino de leão seja leoa, de gato seja gata, tudo bem. Mas por que outras palavras se repartem em masculinas e femininas? O sol, por […]
? “A morte do boêmio” (Hilton Görresen)
A MORTE DO BOÊMIO Hoje, fui ao enterro do Mija na Sogra. Eu o conheço há muitos anos, mas só agora, olhando a placa diante da sala da funerária, é que soube de seu nome de batismo: Antolípio. Putzgril, se tivesse um nome desses, preferia mesmo ser chamado pelo apelido. Estava, naturalmente, deitado no […]
Ac. Hilton leu “Tartarin de Tarascon”, de Alphonse Daudet
TARTARIN DE TARASCON – Alphonse Daudet (1840-1897) Resenha de Hilton Görresen O cinema tem nos acostumado a vibrar com os feitos de heróis infalíveis. Alguns, é verdade, passam por maus momentos nas mãos dos inimigos, mas acabam alcançando a vitória. Isso, é claro, não reflete a nossa realidade, a realidade de pessoas comuns. O que […]
O cara que sabia voar (Hilton)
O CARA QUE SABIA VOAR Hilton Görresen Certo dia, o cara descobriu que podia voar. Não, não estou maluco. Está provado que voar é uma coisa possível, já houve antecedentes. Vejam por exemplo o Superman, o Capitão Marvel, o Peter Pan… Foi pura coincidência: quis pular de algum lugar alto, deu impulso e […]
Golpe do cheque (Hilton)
GOLPE DO CHEQUE (uma alegoria) Hilton Görresen Alguém aí já foi vítima de um golpe do cheque? Pois nem lhes conto. Estava andando tranquilamente pela cidade, quando, de súbito, fui golpeado traiçoeiramente por um cheque. Quando me refiz da surpresa, vi que era um cheque meio desbotado, com duas listras paralelas no peito. Era […]
Como é que eu pude sobreviver? (Hilton)
COMO É QUE PUDE SOBREVIVER? Hilton Görresen Considero-me um sobrevivente. Sou do tempo em que se vivia perigosamente, segundo os parâmetros atuais. Sim, confesso que tive uma vida desregrada. Andava descalço, com os pés na poeira, no lodo e muitas vezes nas pedras cheias de ostras. É verdade que às vezes voltava para casa com […]
“O descascador de laranjas” (Hilton Görresen)
O DESCASCADOR DE LARANJAS Cantou durante o verão? Agora dance! Sentou no degrau diante da porta – a casa tinha a frente na calçada –, colocou ao lado a mochila puída, abriu-a e retirou uma laranja. Tirou o canivete do bolso da calça e começou a descascá-la vagarosamente. Podia deixar a fruta nua […]
O novo amiguinho (Hilton)
O NOVO AMIGUINHO Hilton Görresen O guri se queixava que os amigos maiores batiam nele. Naquele tempo não tinha essa de bullying, era saber se defender. Fica em casa, dizia o pai, de saco cheio. Mas não, não podia deixá-lo trancado por causa de meia dúzia de pivetinhos. Tinha de resolver o problema. Um […]
Era o dia de procurar a cestinha… (Hilton)
ERA O DIA DE PROCURAR A CESTINHA… Hilton Görresen A época do Barroco – com seu detalhismo artístico, suas imagens de santos sofredores e anjos gordinhos –, deixou como herança cultural todo um estilo de vida. Era uma época na qual se cultuavam as aparências (culto levado hoje à exorbitância), os bons modos e as […]
Ac. Hilton leu “Chove sobre minha infância”, de Miguel Sanches Neto
BREVE RESENHA Chove sobre minha infância – Miguel Sanches Neto (Editora Record, 2000) Livro de estreia do escritor, cronista e crítico literário Miguel Sanches Neto, “para gastar este extenso estoque de silêncio, para dissipar esta herança de desejos”. Trata-se de livro de memórias, narradas em primeira pessoa como se deduz de seu título. Nascido […]
De saco para mala (Hilton)
DE SACO PRA MALA Hilton Görresen Uma das palavras mais desprestigiadas do país é sem dúvida a palavra “saco”. Pelo que sei, é somente utilizada em sentido negativo. Quando o sujeito é chato, é geralmente um “saco” ou um “pé no saco”. Quando é aborrecido ou inconveniente está “enchendo o saco”. Quando se encontra inutilmente […]
O homem com o chapéu ridículo (Hilton)
O HOMEM COM O CHAPÉU RIDÍCULO Hilton Gorresen Quando ele ia saindo, a mulher o interpelou: – Não me diga que você vai sair pra rua com este chapéu ridículo! A mulher era daquelas que se incomodava com o que os outros iriam dizer, e falou: o que os outros não vão dizer? –Tô […]
Lobato ensina gramática (Hilton)
LOBATO ENSINA GRAMÁTICA Hilton Gorresen No início de minha adolescência, um vizinho adquiriu a coleção de livros infantojuvenis do Monteiro Lobato para as filhas lerem. Ignoro se elas chegaram a ler algum dos volumes, mas eu li todos. Todas as tardes, enquanto o casal se embrenhava com os amigos numa partida de canastra, eu entrava […]
? “O dia em que Ataliba sumiu”, de Hilton Görresen
O DIA EM QUE ATALIBA SUMIU Hilton Gorresen Muitos anos depois, os antigos hóspedes ainda perguntariam: – E o Ataliba, não conseguiu mais encontrar? Dona Mercês, a gerente da pensão, sacudia a cabeça entristecida, era a resposta. Naquela manhã, a primeira coisa que fez ao acordar foi levar o pires de leite ao local […]
Palavras, palavras… (Hilton)
PALAVRAS, PALAVRAS… Hilton Görresen Cheguei a uma oficina, abri o capô do carro e falei: quero substituir o hemistíquio no cabo do esquizoide. Os mecânicos olharam disfarçadamente um para o outro, rindo-se com as mãos sobre a boca. Tinha dito aquilo de propósito. Mas para um leigo em mecânica essas palavras teriam o mesmo efeito […]
“Boas ideias” para incentivar a leitura (Hilton)
“BOAS IDEIAS” PARA INCENTIVAR A LEITURA Hilton Görresen É uma lástima! Costuma-se dizer que brasileiro não lê. Como poderia ler se vive num mundo audiovisual, formado por TV, DVD, videogames, smartphones, Iphones e outras novidades que a cada dia mais se aprimoram? Para que as pessoas leiam é preciso facilitar ao máximo sua “interface” com […]
Edições Maravilhosas (Hilton)
EDIÇÕES MARAVILHOSAS Hilton Görresen Sempre tenho dito que meu primeiro contato com a literatura foi através dos livros deixados por meu avô. O velho, que não cheguei a conhecer, era músico e jornalista (certamente da época parnasiana, em que se teciam longos e complicados parágrafos). Mas isso não é bem verdade: na realidade, meu primeiro […]
O magnífica discurso (Hilton)
O MAGNÍFICO DISCURSO (Sátira) Hilton Gorresen Quando Genecildo subiu ao palanque, o locutor pediu silêncio e anunciou o começo da grande e vitoriosa jornada: – E agora, com vocês, este cidadão brilhante, dedicado ao seu povo e à sua terra, a terra onde nasceu – o futuro vereador (pausa para as palmas) Genecildo Bonifrates. Sentiu um arrepio pelo corpo. Parecia flutuar sobre […]
Ano Novo, vida nova (Hilton)
ANO NOVO, VIDA NOVA Hilton Görresen Acordou ainda meio tonto. Sua cabeça parecia feita de cortiça. A noite anterior, última do ano, tinha sido da pesada, muita comida, muita champanha, abraços, exclamações efusivas: ano novo, vida nova! Pois sim – pensou –, ano novo, velhos problemas, velhas dívidas, velha mulher… Pulou da cama e foi […]
Papai Noel esteve aqui (Hilton)
PAPAI NOEL ESTEVE AQUI Hilton Görresen Puta, que humilhação. Calorzão de dezembro, eu com essa barba incômoda, travesseiro na barriga, roupinha vermelha. Pescoço empapado de suor. Mas não tinha jeito, eu estava duro, completamente durango kid. Me ofereceram este bico de Papai Noel. Se os amigos de boteco me vissem ia ser uma puta gozação. […]
O dia em que vi Papai Noel (Hilton)
O DIA EM QUE VI PAPAI NOEL Hilton Görresen Quando era garoto, o Natal lá em casa não tinha muita comilança nem “bebelança”. Às 19 horas, minha mãe postava a mesa e sentávamos para o que conhecíamos por jantar de Natal: arroz, maionese e galinha recheada, sem esquecer da sobremesa. Comer galinha não era coisa […]
Crônica do crioulo doido (Hilton)
CRÔNICA DO CRIOULO DOIDO Hilton Görresen Um amigo me telefonou logo cedo: – Tenho más noticias! O sangue me subiu rápido pra cabeça. E ele continuou com voz compungida: – A camélia… caiu do galho, deu dois suspiros e depois morreu. O cravo já se encontrava na UTI por causa de uma briga violenta com […]
Livro de contos do acadêmico Hilton Görresen é o “destaque do ano” da ACL
Vejam a sinopse dos contos feitas pelo próprio autor. Depois, não deixem de ler o livro! POR QUE MATEI ROCKY LANE? Trata-se de uma coletânea com 24 contos de autoria do acadêmico Hilton Gorresen, edição da Editora Areia – Joinville – 2018. TRABALHINHO É a história de um jovem desempregado, como muitos outros, […]
Palavras, palavras (Hilton)
PALAVRAS, PALAVRAS… Cheguei a uma oficina, abri o capô do carro e falei: quero substituir o hemistíquio no cabo do esquizóide. Os mecânicos olharam disfarçadamente um para o outro, rindo-se com as mãos sobre a boca. Tinha dito aquilo de propósito. Mas para um leigo em mecânica essas palavras teriam o mesmo efeito de outras […]
Desculpa, Zé
Entro no bar à noite, quase deserto. O balcão ocupa todo o lado esquerdo. Do lado direito, espalhadas, umas dez mesinhas com toalhas de plástico. Um casal numa mesa. Detrás do balcão, um gordo de bigode, camisa de mangas arregaçadas. Peço uma cerveja. O gordo tira a garrafa de um frigorifico, puxa um copo de […]
Você também é cinestésico?
Acho que sou cinestésico (não confundir com cinéfilo). Mas não se preocupe, não é coisa grave. Quê? Você não sabe o que é isso? De acordo com a neurolinguística, nossa percepção da realidade se dá por três canais diferentes – visual, auditivo e (aí vem ele) cinestésico, referente aos demais sentidos. Os visuais são aqueles […]
? “Teu sorriso me dá ódio” de Hilton Görresen
Há palavras e olhares que ferem mais do que uma punhalada. E ficam incrustados mais tempo em nosso íntimo. Quando informei que iria fazer concurso para um órgão público, Donato deu uma risadinha de lado, como a dizer “nem tente!”. Ele já era funcionário do órgão há uns dois anos, havia sido aprovado “brilhantemente” no […]
Histórias e lendas de São Francisco do Sul
Para se falar de nossas lendas, é bom dar umas pinceladas em nossa História. Há indícios de que o homem branco tenha aportado em São Francisco, logo após o descobrimento do Brasil. Os indícios se referem à expedição comandada pelo francês Binot Paulmier de Gonneville, que teria aqui aportado em 5 de janeiro de 1504. […]
Como e por que comecei a escrever
Tudo começou com a leitura (ninguém se torna escritor sem ter sido primeiro um leitor). Aprendi a ler muito cedo, por conta própria, revirando a cartilha deixada por uma empregada. Quando iniciei o curso primário já lia bem. Tirava de letra as palavras ditadas pela irmã nas aulas de linguagem no Colégio Stela Matutina. Lembro […]
Meu céu particular
A ideia de um lugar no Universo (ou fora dele), onde os bons receberiam depois da morte sua recompensa pelos atos praticados, existe desde tempos imemoriais (que belo lugar-comum). Para os gregos era o Olimpo, para os nórdicos o Walhala, para os índios americanos os sagrados campos de caça. Diferentes crenças e religiões interpretam ou […]
Pobre crônica!
Vida breve tem a crônica. O cronista procura, em sua visão, peneirar a realidade; senta diante da máquina (ou da telinha do micro) e escolhe as palavras para se comunicar com o leitor, preocupa-se com a coerência do texto e com a clareza das frases. No dia seguinte seu texto já está fazendo parte de […]
Sorria, você está na terceira idade
Chegar à terceira idade é uma sorte. Pelo menos isso é o que pensariam aqueles que não chegaram lá, ficaram pelo caminho. Terceira idade é um conceito flutuante. É ter ultrapassado o último terço de vida, considerando o período médio de vida das pessoas, ou como se costuma dizer, estar “vivendo no lucro”. Alguns séculos […]
Mocinhos e bandidos
Em meados do século 19, alguns remanescentes da corrida do ouro na Califórnia olharam em volta de si, para as imensas pastagens do oeste, e perceberam que eram o lugar ideal para criação de gado. Para cuidar de seus rebanhos e conduzi-los através das pradarias até os pontos de venda é que surgiu a pitoresca […]
Frívolo peralta
Você conhece o Tertuliano? Não, não é esse. Tertuliano é o personagem de um versinho do Arthur de Azevedo (aquele do conto “Plebiscito” que constava de muitos livros escolares, também autor da comédia “Amor por anexins”). A poesia começava assim: “Tertuliano, frívolo peralta/que fora um paspalhão desde fedelho/ tipo incapaz de ouvir um bom conselho/ […]
O bêbado e o batráquio
Sem saber como, foi parar no chão enlameado (mas nós sabemos como: saiu do bar, deu alguns passos trôpegos, deslizou na lama e foi de nádegas no chão). De olhos entreabertos, avistou um pequeno ser esverdeado, parado em sua frente e que o olhava com curiosidade. Era o tal do batráquio do título, mais especificamente, […]
Um negócio difícil
Seu André alugou um Opala e fomos para Tequiné dos Montes. A estrada era ruim, uma reta estreita, escalavrada. O Opala ia aos pulos. Às vezes, olhava pra mim, ao lado, e se vangloriava: – Vou mostrar pra essa caipirada como se vende apólices, moleque. Vamos colocar umas vinte no mínimo. Voltamos cedo, quero ainda […]
Romeu, Romeu, agora tu é meu!
Logo que desembarcaram do ônibus, a mulher detestou a pequena cidade. Era uma mulherzinha baixa, gordota, cabelos curtos, jeito arrogante. O marido, Doutor Juvêncio, tinha vindo para assumir a chefia de uma repartição pública, nomeado pelo interventor militar da região. Autoritária, convocou o Zé Gerôncio para carregar suas malas até um táxi. A primeira impressão […]
Eles não deixam
Eles não deixam trazer a Ritinha para cá. Eles me suportam, não conseguem me expulsar da casa, mas se a trouxer, dizem, vai haver problema. O velho foi quem construiu o casarão, no século 19. Era português de origem, veio para cá sem nada, em busca de fortuna. Entrou no comércio, inicialmente como caixeiro de […]
Trabalhinho
Eu havia recebido recado para ligar urgente pro Pivica. Ligar como, se eu não tinha mais crédito no celular? Ele, se quisesse falar comigo, que entrasse em contato. Foda-se. Peguei na geladeira a última latinha de cerveja, me sentei na poltrona já puída e fui saboreando a bebida aos pouquinhos. Puta miséria! Foi quando tocou […]
Casaco de peles
A mulher entrou na loja e foi direto à vendedora. Era uma mulherzinha baixa, seios pesados, pisadas firmes e determinadas. – Quero ver aquele casaco de peles da vitrine. Ver era o modo de dizer. Ela o havia visto e admirado inúmeras vezes. Um casaco bege com estrias escuras. Levara semanas tentando conseguir o valor […]
UM NEGÓCIO DIFÍCIL
Seu André alugou um Opala e fomos para Tequiné dos Montes. A estrada era ruim, uma reta estreita, escalavrada. O Opala ia aos pulos. Às vezes, olhava pra mim, ao lado, e se vangloriava: – Vou mostrar pra essa caipirada como se vende apólices, moleque. Vamos colocar umas vinte no mínimo. Voltamos cedo, quero ainda […]
David Gonçalves – Recepção por Hilton Görresen
Senhor Presidente, senhores componentes da mesa, colegas acadêmicos e demais amigos que nos honram com sua presença: Quando vim para Joinville, na década de 1970, tornei-me incontinente associado de nossa Biblioteca Pública. Numa de minhas visitas a essa entidade, a diretora, Selma Carneiro, me falou: esteve aqui um jovem dizendo-se escritor e deixou um exemplar […]